Insensatez na
educação
Comemorada por estudantes, professores,
movimentos sociais e ONGs, a destinação de 10% do Produto Interno Bruto (PIB)
para a educação, aprovada pela Câmara às vésperas do recesso legislativo de
julho, é uma insensatez que está se convertendo em enorme problema político
para o governo. O primeiro equívoco foi cometido em 2010 pelo Ministério da
Educação. Apesar de o Brasil ter elevado os investimentos no setor de 3,9% para
5,1% do PIB, entre 2003 e 2009, aproximando-se do porcentual aplicado pelos
países desenvolvidos e vários países em desenvolvimento, a equipe do ministro
Fernando Haddad cedeu a pressões e previu o gasto mínimo de 7% no projeto do
Plano Nacional de Educação (PNE) da atual década.
O segundo equívoco foi cometido há um mês.
Preocupados em levantar uma bandeira política para as eleições de outubro,
deputados de todos os partidos - inclusive da base aliada - aumentaram de 7%
para 7,5% do PIB o gasto mínimo do poder público em ensino. A elevação de 0,5%
do PIB no orçamento da educação representa R$ 25 bilhões a mais em
investimentos. Mas, na hora da votação, os líderes partidários, argumentando
que havia necessidade de recursos para a implantação do regime de tempo
integral no ensino fundamental, aprovaram 10% do PIB.
Às vésperas da votação, o Ministério da
Fazenda tentou persuadir as lideranças partidárias a rejeitar a proposta de 10%
do PIB, mas o fez de forma pouco enfática, para não atrapalhar a campanha de
Haddad à Prefeitura de São Paulo. Esse foi o terceiro equívoco. Ao cobrar
responsabilidade fiscal e orçamentária da Câmara, o governo ouviu que o Senado
poderá derrubar a proposta de 10% do PIB sem maiores constrangimentos
políticos, depois das eleições de outubro.
Como estudantes e professores já afirmaram
que se mobilizarão para impedir a reeleição dos senadores que votarem contra a
proposta, o Palácio do Planalto teve de se mexer para evitar que esses
equívocos se convertam em desastre, quando ela for votada pelo Senado. Depois
de passar o primeiro semestre tentando se equilibrar entre a austeridade fiscal
e a demanda por mais gastos federais feita por entidades que sempre estiveram
na base do PT, o ministro Aloizio Mercadante finalmente foi taxativo.
"É impossível cumprir a decisão da
Câmara. Para chegar a 10% do PIB, são necessários R$ 210 bilhões - o
equivalente a cinco CPMFs - e não há espaço para a criação de novos
impostos", disse ele. Mercadante também lembrou a relação entre demografia
e educação - tema que Haddad desprezou, por conveniência eleiçoeira. Como a
população está envelhecendo, o número de pessoas em idade escolar começou a
diminuir. Entre 2009 e 2011, houve redução de 1,8 milhão de matrículas na rede
pública de ensino fundamental. Em 2010, havia 47,1 milhões de brasileiros em
idade escolar e, segundo o IBGE, haverá 41,5 milhões, em 2020.
Por causa do envelhecimento da população, a
equipe econômica do governo alega que, se os municípios, os Estados e a União
mantiverem o atual nível de gasto de 5,1% do PIB, seria possível aumentar o
investimento por aluno em 45%, até 2020, já descontada a inflação. O mesmo
argumento também é invocado pelas ONGs do setor. "Do jeito que as coisas
estão, dinheiro a mais não causará impacto", diz a diretora do Todos Pela
Educação, Priscila Cruz, depois de afirmar que o problema do setor não é de escassez
de recursos, mas de gestão.
O que se teme é que, além de prejudicar
programas de saúde e saneamento, a destinação de 10% do PIB para a educação
aumente os gastos perdulários. A partir de 2003, por exemplo, o governo Lula
expandiu sem planejamento as universidades federais. Além de ter criado
instituições onde não havia demanda e não ter cobrado resultados, ele
negligenciou a formação básica de crianças e jovens, menosprezando a qualidade
da formação técnica. Não há dúvida de que a educação é prioritária. Mas a
destinação de recursos para a área deve ser compatível com as realidades
demográfica e orçamentária. É isso que o Senado tem de compreender, quando
votar o PNE.