O “vício em sexo” é uma doença de verdade?
Pesquisadores
propõem novos critérios para o diagnóstico e debatem se condição é um distúrbio
ou apenas mau comportamento
Nos
últimos anos, “ vício em sexo ” foi a desculpa de
muitos famosos flagrados pela imprensa de celebridades traindo seus
parceiros. Mas será que o que psicólogos chamam de "transtorno
hipersexual" é uma patologia real ou apenas uma desculpa esfarrapada para
o mau comportamento?
O
problema é real. Há a chance de o transtorno ser incluído na próxima revisão do
Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM), considerado a
"bíblia" dos psicólogos e psiquiatras.
Agora,
uma equipe de especialistas formulou critérios que podem ajudar terapeutas a
identificar corretamente a doença, já de olho no tratamento.
Para
testar os critérios, os pesquisadores fizeram entrevistas e conduziram testes
psicológicos com 207 pacientes tratados em várias clínicas de saúde mental nos
Estados Unidos. Todos os participantes buscavam ajuda para controlar seu
comportamento sexual, por abuso de substância ou outras condições psiquiátricas
como depressão ou ansiedade.
Aplicando
a teoria sobre os dados obtidos dos participantes, os pesquisadores disseram
ter encontrado com precisão 93% das pessoas do grupo que tinha o transtorno
hipersexual.
Causando
problemas
De
acordo com um dos pesquisadores, a questão fundamental é saber se o descontrole
sexual está interferindo na vida da pessoa e se ela se sente impotente para
mudar isso.
"O
ponto é o comportamento sexual que está causando problemas, seja ele fora de
controle, ou com risco de contágio de doenças", disse o co-autor das
diretrizes Rory Reid, um professor assistente de psiquiatria da Universidade da
Califórnia, em Los Angeles. "Geralmente são as consequências [do
comportamento hiperssexual] que trazem as pessoas através da porta."
Reid
acrescentou que considera o termo "vício em sexo" um equívoco.
"Eu não chamaria isso de vício em sexo, porque não temos informações para
defini-lo realmente como uma compulsão", explicou.
Para
atender aos critérios de classificação como transtorno hipersexual, o
comportamento deve causar danos. "Se um paciente está se envolvendo em um
determinado comportamento sexual que não machuca a si próprio ou aos outros,
não é um problema", explicou.
Mas
o que eles querem dizer com "causar danos"? Para um exemplo
particularmente perturbador, Reid descreveu um paciente, piloto de cargas
aéreas, que se envolve em asfixia autoerótica uma vez por mês – masturbando-se
em altitude elevada a ponto de desmaiar.
Os
resultados do estudo, publicados na edição de outubro do “Journal of Sexual
Medicine”, definem um conjunto de critérios que mostram o que deve ser
considerado como transtorno hipersexual.
Os
critérios incluem:
Comportamento
recorrente ao longo de um período de pelo menos seis meses.
Recorrentes
e intensas fantasias sexuais, muitas vezes em resposta à ansiedade, depressão e
estados de humor ou outros eventos estressantes.
Tentativas
da pessoa de controlar ou reduzir o comportamento.
Comportamentos
que envolvem risco para si ou para outras pessoas, causam sofrimento
clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento pessoal.
Algumas
condições excluem o diagnóstico de transtorno hipersexual: o abuso de drogas
(as fantasias sexuais ou comportamentos de risco costumam ocorrer sob
influência), condições médicas subjacentes e a faixa etária (o diagnóstico
geralmente não é feito para menores de 18 anos).
No
entanto, segundo Reid, o estudo mostra que, na maioria das vezes, a doença tem
suas raízes na adolescência ou início da idade adulta. Os comportamentos
sexuais mais comumente associados com o problema são a masturbação e uso
excessivo de pornografia, sexo consentido com um adulto e sexo virtual. Fatores
de risco são sexo com prostitutas, traição em série ou ter uma média de 15
parceiros sexuais diferentes em um ano.
Tratamento
A
boa notícia é que o transtorno hipersexual pode ser tratado. De acordo com
Reid, o tratamento inclui terapia comportamental cognitiva ou terapia
experimental para ajudar as pessoas a processar suas emoções e desenvolver
habilidades de enfrentamento, meditação para ajudar os pacientes a aumentar a
sua tolerância aos desejos e grupos de recuperação.
Ainda
assim, alguns se questionam se rotular o comportamento sexual como uma
patologia é simplesmente transformar o comportamento adulto normal em uma
doença. Mas James Maddux, professor emérito de psicologia da Universidade
George Mason em Fairfax, Virgínia, diz que, nesse caso, não é o que está
acontecendo.
"Estou
sempre cético em relação a estes chamados “transtornos” novos, mas neste caso
acho que se justifica", disse ele. O ponto fundamental, segundo ele, é que
"a pesquisa é baseada em pessoas que realmente procuraram ajuda e são
perturbadas pela condição."
Reid
disse que emplacar os novos critérios no próximo Manual Diagnóstico e
Estatístico de Transtornos Mentais, o DSM-5, iria alinhar os diagnósticos
destes problemas sexuais. "Se esse transtorno for incluído no DSM-5, não
vai estar nas primeiras páginas, mas como um item apêndice – o que significa
que mais pesquisa é necessária", disse ele.