Encontrar um estranho pelos corredores
de um aeroporto nunca foi tão sexy. Pelo menos até esse momento...
Leia um trecho do livro "Um
Toque de Vermelho"
Ele zanzava de um lado para outro num
canto mais afastado da área de espera, com uma passada precisa e controlada,
demarcada pelas longas pernas vestidas num jeans claro. Os cabelos grossos e
escuros ligeiramente compridos, emoldurando seu rosto másculo. Uma camiseta
creme com gola em V escondia seus ombros fortes, um sinal de que as partes que
as roupas ocultavam faziam jus às que deixavam expostas.
Lindsay afastou da testa uma mecha
dos cabelos molhados para apreciar melhor os detalhes. Sex appeal da cabeça aos
pés, era o que aquele cara tinha. Do tipo que é impossível de fingir ou imitar
- do tipo que transformava a beleza física num simples bônus.
Ele se movia por
entre a multidão sem nem levantar os olhos, e mesmo assim foi capaz de se
desviar de um homem que cruzou seu caminho. Sua atenção estava toda concentrada
num BlackBerry, demonstrando tamanha habilidade na digitação que o ventre de
Lindsay se contraiu. Uma gota de chuva desceu por sua nuca. O contato suave com
água fria fez com que a experiência de observá-lo se tornasse fisicamente mais
intensa.
Atrás dele, os vidros transparentes revelavam o céu cinzento do fim da
tarde. A chuva escorria pelas janelas do terminal. Aquele mau tempo era
inesperado, e não apenas porque o relatório meteorológico não previa chuva. Ela
sempre tinha sido capaz de sentir a proximidade das chuvas com uma precisão
incomum, mas essa tempestade lhe havia passado despercebida. Fazia sol quando
ela aterrissou, e pouco depois o céu desabou.
Ela adorava chuva, e em outra ocasião
qualquer não se importaria de sair no meio do aguaceiro para pegar o ônibus que
a levaria até o avião. Naquele dia, porém, o mau tempo parecia carregar consigo
um mau agouro. Uma sensação de melancolia, ou de luto. E ela havia se deixado
levar por isso.
Desde que era capaz de se lembrar,
Lindsay sentia que o vento se comunicava com ela. Fosse gritando em meio a uma
tempestade ou sussurrando através de uma brisa, ela sempre conseguia decifrar a
mensagem. Não por meio de palavras, mas de sensações. Seu pai chamava isso de
sexto sentido e fez de tudo para demonstrar que era uma coisa exótica e
interessante, e não alguma espécie de aberração grotesca.
Esse radar interior era o que
direcionava seu olhar para aquele homem no portão de embarque, mais ainda que a
beleza dele. Em sua aparência, havia algo de melancólico que a fazia lembrar a
tempestade que tomava força atrás da janela. Era aquela qualidade que a
atraía... além da ausência de uma aliança no dedo dele.
Lindsay se virou, ficou de frente
para o homem e desejou que ele a olhasse. Ele ergueu a cabeça. Seus olhares se
encontraram. Foi como se ela tivesse recebido uma rajada de vento no rosto,
fazendo com que seus cabeços se arrepiassem. Mas a sensação não era de frieza,
e sim de um calor úmido e sedutor. Lindsay manteve os olhos fixos nele por um
instante que pareceu infinito, hipnotizada por seus olhos azuis cintilantes,
que demonstravam sintonia com a fúria ancestral da tempestade lá fora.
Ela respirou fundo e tomou o caminho
de uma lojinha de pretzels ali ao lado, dando a ele a oportunidade de retribuir
o óbvio interesse manifestado por ela... ou não. Meio que por instinto, ela
sabia que ele não era o tipo de homem que corria atrás de mulher. Lindsay foi
até o balcão e olhou o cardápio.
O cheiro da massa quentinha e macia e da
manteiga derretida era de dar água na boca. A última coisa de que ela precisava
antes de ficar sentada por mais uma hora num avião era uma bomba calórica como
um pretzel gigante. Por outro lado, talvez uma boa dose de serotonina fosse
capaz de acalmar seus nervos exaltados pela sensação de estar espremida numa
multidão.
Ela fez o pedido. "Palitinhos de
pretzel, por favor. Com molho marinara e um refrigerante diet." A moça do
caixa informou o valor. Ela remexeu na bolsa em busca da carteira.
"Pode deixar."
Minha nossa... aquela voz.
Sedutoramente sonora. Lindsay tinha certeza de que era ele. Ele se inclinou em
sua direção, e ela sentiu o perfume exótico dele. Não era colônia. Era um
cheiro de homem. Natural e viril. Puro e límpido, como o ar depois de uma tempestade.
Ele fez a nota de vinte dólares deslizar pelo balcão. Ela sorriu e deixou que
ele pagasse.
Era uma pena que estivesse vestida
com um jeans velho, uma camiseta larga e coturnos. Nada poderia ser mais
confortável, mas para aquele homem ela preferia estar bonita e arrumada. Ele
evidentemente pertencia a um outro mundo, o que ficava claro pela beleza de
astro de cinema e pelo relógio Vacheron Constantin que ostentava no pulso. Ela
se virou e estendeu a mão para ele. "Obrigada, senhor...?"
"Adrian Mitchell." Ele
aceitou o cumprimento e aproveitou para acariciar seus dedos com os polegares.
Lindsay sentiu uma reação visceral ao toque dele. Ficou quase sem fôlego, e seu
coração disparou. Visto de perto, ele era irresistível. Ferozmente masculino e
terrivelmente lindo. Impecável. "Olá, Adrian Mitchell."
Ele se agachou e pegou a etiqueta da
mala dela com seus dedos longos e masculinos. "Prazer em conhecê-la,
Lindsay Gibson... de Raleigh? Ou está voltando de viagem?" "Estou
indo para o mesmo lugar que você. No mesmo avião." Os olhos dele tinham um
tom de azul muito pouco habitual. Como a coloração cerúlea que se vê no coração
das chamas. Combinados com a pele morena e emoldurados pelos cílios compridos,
eram simplesmente deslumbrantes.
E estavam concentrados nela como se
não houvesse mais nada no mundo para se ver.
Ele a observou da cabeça aos pés com
um olhar intenso. Lindsay se sentiu exposta e envergonhada, como se ele a
tivesse despido em pensamento. Seu corpo reagiu à provocação. Os seios incharam, a tensão nos músculos foi
se dissipando.
Qualquer mulher teria amolecido toda
diante dele, porque não havia nada naquele corpo que denunciasse um sinal
qualquer de insegurança. Dos ombros largos e os bíceps delineados até as
feições milimetricamente esculpidas do rosto, cada ângulo do corpo dele parecia
afiado e preciso.
Ele se inclinou sobre ela para pegar
o troco, movimentando-se de maneira ágil e naturalmente elegante. Aposto que
ele deve ser um animal na cama. Excitada pelo próprio pensamento, Lindsay apanhou
a mala pela alça. "Então você mora no Orange County? Ou está viajando a
negócios?"
"Estou indo para casa. Para
Anaheim. E você?"
Ela foi até o outro balcão, para
pegar seu pedido. Ele a seguiu com uma passada mais comedida, mas que não
escondia a determinação de ir atrás dela. Essa característica um tanto
predatória fez com que ela ficasse ansiosa. Sua sorte enfim havia mudado - seu
destino final também era Anaheim.
"O Orange County é o meu futuro
lar. Estou me mudando para lá, a trabalho." Ela preferiu não entrar em
detalhes, como a cidade em que ia morar. Sabia bem como se proteger quando era
necessário, mas não estava disposta a arrumar mais problemas além dos que já
tinha.
"É uma grande mudança. Para o
outro lado do país."
"Estava na hora de mudar."
Ele abriu um leve sorriso.
"Vamos jantar juntos."
O tom aveludado da voz dele fez o
interesse dela crescer ainda mais. Ele era carismático e tinha uma
personalidade magnética, duas qualidades capazes de produzir relacionamentos
memoráveis, ainda que de curta duração. Ela pegou o saquinho de papel e o refrigerante
que a atendente entregou.
"Você vai direto ao ponto. Eu
gosto disso."
A chamada para o voo fez com que sua
atenção se voltasse para o portão de embarque. Na verdade era o anúncio de um
pequeno atraso, o que deixou os passageiros um tanto inquietos. Adrian não
tirava os olhos dela. Ele apontou para uma fileira de assentos logo adiante.
"Ainda temos tempo para nos conhecer melhor."
Lindsay o acompanhou até lá. Deu
outra espiada ao redor, e viu que não eram poucas as mulheres com os olhos
vidrados em Adrian. A sensação de que ele era como uma tempestade em pleno
curso não parecia mais tão intensa, e a chuva lá fora se tornou pouco mais que
uma garoa forte.
A correlação entre os dois eventos era intrigante A reação feroz que sentiu ao ver Adrian Mitchell
e aquela capacidade sem igual de despertar seu radar meteorológico interior
foram determinantes para a decisão de deixá-lo se aproximar. As anomalias de
sua vida sempre mereciam uma maior investigação.
Ele esperou que ela se sentasse antes
de perguntar: "Algum amigo vai buscar você no aeroporto? Ou algum
parente?." Não havia ninguém à espera dela, apenas uma van reservada para
levá-la ao hotel onde se hospedaria até encontrar um apartamento. "Não é
aconselhável fornecer esse tipo de informação a um estranho."
"Então vamos amenizar os
riscos." Ele se inclinou com um gesto fluido, levando a mão ao banco de
trás para pegar a carteira. Tirou um cartão de visita e entregou para ela.
"Ligue para quem estiver à sua espera e diga quem eu sou e como entrar em
contato comigo."
"Você é bastante
determinado." E claramente está acostumado a dar ordens. Ela não se
importou. Lindsay tinha a personalidade forte e, se não encontrasse
resistência, acabava ela mesma assumindo o comando. Homens dóceis e gentis eram
desejáveis em certas situações, mas não em sua vida pessoal.
"Sou mesmo", ele concordou,
sem hesitação.
Lindsay apanhou o cartão. Seus dedos
se tocaram, e a eletricidade subiu pelo braço dela.
Ele respirou fundo, pegou a mão dela
e acariciou a palma com os dedos. Parecia que estava mexendo entre suas pernas,
porque o nível de excitação foi o mesmo. Ele a olhava com um desejo sexual
quase palpável, intenso e implacável. Como se soubesse exatamente o que fazer
para deixá-la toda entregue... ou estivesse prestes a descobrir.
"Você está me parecendo encrenca
certa", ela murmurou, fechando a mão para que ele não tirasse os dedos.
"Vamos jantar. E conversar.
Prometo que vou me comportar." Sem largá-lo nem por um minuto, ela pegou o
cartão de visita com a outra mão. O sangue pulsava com força em suas veias por
causa daquela excitação tão imediata e imprevista. Mitchell Aeronáutica, ela leu. "E você está viajando
num voo regular."
"Eu tinha outros planos." O
tom de voz dele ficou sério. "Mas meu piloto me deixou na mão."
O piloto dele. Ela abriu um
sorrisinho. "Você não odeia quando isso acontece?"
"Geralmente, sim... Mas aí
apareceu você." Ele sacou o Black- Berry do bolso. "Use o meu
telefone, assim quem atender já vai ter o número."
Não sem alguma relutância, Lindsay o
soltou e pegou o celular, apesar de poder muito bem usar o seu. Deixou o
refrigerante no chão acarpetado e levantou. Adrian fez o mesmo. Ele era rico,
elegante, educado, solícito e lindo de morrer.
Apesar de parecer um sujeito
civilizado, havia um quê de perigo pairando sobre ele, algo que apelava para os
instintos mais elementares de uma mulher. Talvez o aeroporto lotado tivesse
aguçado seus sentidos. Ou talvez fosse o indicativo de uma química sexual
volátil entre os dois. Fosse o que fosse, ela não estava achando nada ruim.
Deixando o saquinho com os pretzels
no assento, ela se afastou um pouco e digitou o número da oficina mecânica de
seu pai. Enquanto isso, Adrian foi até o balcão do portão de embarque.
"Linds. Você já chegou?"
Ela ficou surpresa com o modo como
ele atendeu. "Como você sabia que era eu?"
"Eu vi o número que estava
ligando. O código é da Califórnia."
"Ainda estou em Phoenix, na
conexão. Estou ligando de um celular emprestado."
"O que aconteceu com o seu? E
por que ainda está em Phoenix?"
Eddie Gibson criou sozinho a filha
durante vinte anos, e era um pai superprotetor, o que não era de se estranhar
ao levar em conta as circunstâncias terríveis da morte de Regina Gibson.
"Não aconteceu nada com o meu, e
eu perdi a conexão. É que conheci uma pessoa." Lindsay explicou quem era
Adrian e passou as informações contidas no cartão de visita. "Não estou
com medo. É que ele é o tipo de cara que parece estar precisando de um freio.
Acho que não está acostumado a ouvir a palavra 'não' com muita
frequência."
"Acho que não mesmo. Mitchell é
uma espécie de Howard Hughes."
Ela levantou as sobrancelhas. "É
mesmo? Dinheiro, filmes, estrelas de cinema? Ele está metido com tudo
isso?"
Lindsay observou Adrian por trás,
aproveitando a chance de estudá-lo melhor enquanto estava distraído. Era tão
atraente como de frente, tinha as costas largas e um traseiro apetitoso.
"Se você conseguisse se
concentrar em alguma coisa por mais de cinco minutos, saberia disso",
respondeu seu pai.
De fato, ela não era capaz de se
lembrar da última vez que tinha lido uma revista, e havia desistido de assinar
a tevê a cabo fazia muitos anos. Alugava filmes e temporadas inteiras de
seriados, porque não queria perder tempo com os intervalos. "Não estou
conseguindo dar conta nem da minha vida, pai. Onde é que vou arrumar tempo para
cuidar da vida dos outros?"
"Da minha você está sempre
cuidando", ele provocou.
"Você eu conheço. E amo. Mas
celebridades? Não é a minha praia."
"Ele não é uma celebridade. Na
verdade sabe proteger muito bem sua privacidade. Vive numa propriedade enorme
no Orange County. Eu vi na tevê uma vez. É tipo uma maravilha da arquitetura.
Mitchell parece o Hughes porque é um zilionário recluso que adora aviões. A
mídia fica em cima dele porque o pessoal adora aviadores. Isso sempre foi
assim. E dizem que ele é bonitão também, mas isso eu não sei julgar."
E ela o havia distinguido no meio de
uma multidão. "Obrigada pela informação. Eu ligo quando chegar."
"Eu sei que você pode muito bem
se cuidar sozinha, mas juízo."
"Claro. E você, nada de porcaria
no jantar. Faça uma comida de verdade. Ou melhor, arrume uma gata para cozinhar
para você."
"Linds...", ele começou,
fingindo irritação.
Aos risos, ela encerrou a ligação,
depois acessou o histórico de chamadas do celular e apagou o número. Adrian
apareceu com um resto de sorriso ainda nos lábios. Seus movimentos eram tão
fluidos, demonstravam de tal forma sua força e sua confiança, que ela os
considerava ainda mais atraentes que sua aparência. "Tudo certo?"
"Certíssimo."
Ele estava segurando um cartão de
embarque. Lindsay viu seu nome nele e franziu a testa. "Eu tomei a
liberdade", ele explicou, "de pegar assentos vizinhos para nós."