Professor
se recusa a ter aluno de medicina acusado de pedofilia na BA
Estudante
da Faculdade de Medicina da UFBA ficou detido por três anos.
'Como iremos formar uma pessoa que sofre psicopatia?', indaga docente.
Um
professor da Universidade Federal da Bahia (UFBA) iniciou uma discussão na
instituição de ensino depois que um aluno da Faculdade de Medicina ficou detido
três anos por crime de violência sexual contra crianças. Após ser solto, o
rapaz decidiu voltar a estudar e concluir os estudos, a partir do semestre
2012.2, já em curso. Segundo o docente, o estudante não tem condições de se
formar em medicina por possuir uma psicopatia que lhe dá a possibilidade de
voltar a cometer a pedofilia no futuro.
"Eu
era diretor da universidade quando soube que um aluno meu havia sido preso por
atentar contra crianças humildes de Arembepe [região metropolitana de
Salvador]. Convoquei a congregação da faculdade na época, o órgão máximo, que
nomeou um professor que também era advogado, que foi na 16ª DT [Delegacia
Territorial], onde ele estava preso, e trouxe para nós um relato dantesco,
sobre as fotos e filmes que viu por lá", explica José Tavares Neto, hoje
professor da UFBA e médico do Complexo Hospitalar Universitário Prof. Edgard
Santos, também na capital baiana.
A
prisão aconteceu em 2009, depois que o estudante foi condenado sob a acusação
de ter violentado sexualmente mais de 10 garotos, no ano de 2005. A sentença
foi cumprida no Hospital de Custódia e Tratamento, em Salvador, e após cerca de
três anos, o rapaz foi solto, quando deu entrada na renovação da matrícula do
curso na UFBA.
Em
agosto de 2011, a ministra Carmem Lúcia, do Supremo Tribunal Federal, chegou a
negar um pedido de habeas corpus ao rapaz. A decisão apontava
"periculosidade" do paciente e risco de "reiteração
criminosa".
Por
já ter passado dois semestres sem se matricular, a universidade precisaria
analisar o processo e discutir se os motivos apresentados pelo jovem para a
ausência lhe davam o direito de retorno à instituição. De acordo com a
assessoria da universidade, no período da análise, o rapaz correria o risco de
perder a data da matrícula e poderia vir a ser jubilado. Por isso, o estudante
e sua família deram entrada com um pedido de liminar na Justiça Federal, que
através da decisão da juíza Lilían Mota Coutinho, determinou que a UFBA
realizasse a matrícula do jovem provisoriamente, enquanto o processo não fosse
concluído na Justiça.
Segundo
o documento, a liminar da juíza se assegura do direito universal à educação,
presente na Constituição, e no argumento de que o rapaz já cumpriu a sentença
estipulada em juízo pelos crimes que cometeu. A assessoria da Justiça Federal
na Bahia informou que a juíza concedeu a liminar provisória sem conhecimento
dos motivos que teriam levado o rapaz a ficar internado, e que a decisão seria,
também, para garantir que o rapaz não perdesse o direito ao plano de saúde privado
que possui.
De
acordo com Tavares Neto, a presença do aluno nas dependências da universidade
tem causado revolta em professores e estudantes. Segundo o docente, os
professores irão solicitar à Justiça o agravo de instrumento, recurso jurídico
que irá provocar a juíza a analisar novamente a liminar, baseada nos
depoimentos e relatos dos médicos da unidade.
"É
uma psicopatia que uma pessoa tem. Eu não estou aqui me reportando à pessoa do
aluno, mas ao problema que ele tem. A pessoa reincide com muita frequência
nesses casos, tem até países que fazem castração química para evitar isso. Eu
não posso afirmar que ele irá cometer isso novamente, mas diante dessas
circunstâncias, como eu vou formar uma pessoa com esse histórico, se lá pra
frente ele pode ter um poder para atender uma pessoa, acesso a medicamentos, e
a capacidade de abusar de alguém?", indaga o professor.
UFBA
De acordo com Ricardo Miranda, pró-reitor de ensino de graduação da UFBA, a
matrícula do aluno foi feita dentro das normas previstas no regulamento da
universidade, onde consta que qualquer aluno tem o direito de solicitar a
retomada de sua matrícula sob a justificativa de tratamento por decisão
judicial.
"Nesse
caso, a universidade cumpriu o seu papel, seguiu as normas e encarou o aluno como
um ser humano que já cumpriu com aquilo que foi decidido judicialmente. Agora
no outro caso, a Faculdade de Medicina está se debruçando sobre o caso, e
decidindo se o aluno tem ou não condições de realizar o curso, ou seguir a
carreira na pediatria, que é a informação que sabemos que ele quer seguir. A
partir disso, o colegiado chegando a essa conclusão, os professores irão
decidir se é aconselhável que o rapaz mude de curso, se é necessário entrar em
contato com a família dele para debater o assunto, ou se será necessário
acionar a Justiça", pontua Miranda.
De
acordo com Tavares Neto, os professores da faculdade já decidiram entrar com o
pedido na Justiça, que deve acontecer até o dia 5 de dezembro, data limite para
que se recorra da decisão da liminar.
"Ocorre
que várias vezes nesse país. A Justiça solta psicopatas e a sociedade tem que
lidar com essas situações. Não temos uma politica pública para cuidar disso
seriamente. A questão aqui é o que é legal e o que é moral e ético. Essa é a
questão. E nós iremos acionar a Justiça", afirma Tavares Neto.
A
Justiça Federal frisou que o caso poderá ser rediscutido a partir da provocação
dos professores, caso julguem necessário.