segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

Devanear...

Leia um trecho apimentado do romance erótico "Um Amor Submisso"

O livro, escrito por Sophie Morgan, é a continuação de "O Diário de uma Submissa" (Fontanar) e será lançado no Brasil em outubro. Depois de ler, você vai começar a contar os dias para o próximo mês.
Publicado em 13/09/2013Conteúdo NOVA

Eu sabia quando era o aniversário dele. Ele havia mencionado casualmente algumas semanas antes e eu adicionei o evento em meu calendário on-line no dia seguinte. Não sei se seria um exagero confessar isso, então fiquei quieta.


- Pode abrir. - Fiquei corada. Para variar.

Ainda surpreso, ele desfez o laço e abriu a tampa. Levantou um pequeno objeto de plástico com alguns botões; parecia um daqueles aparelhos que abrem a porta da garagem. Ele claramente não sabia o que era. Eu me senti o máximo. Era óbvio que o surpreendi. Mesmo assim, minha voz ainda estava cheia de vergonha quando falei.

- Leia o bilhete. Ele abriu o bilhete e leu as palavras que eu havia escrito com letras azuis caprichadas. - Acho que nós dois sabemos que você tem a habilidade de acionar meus pontos certos de todos os jeitos mais divertidos. Agora você pode fazer isso literalmente. Você está segurando o controle remoto de um ovo vibrador. Você já deve saber onde ele está neste momento. Os botões ligam e desligam o vibrador e variam a velocidade. Quer brincar?

Ele levantou o rosto como uma criança superanimada na manhã de Natal. Ri comigo mesma, sabendo que o brinquedinho o agradaria. Ele sussurrou de susto, mas também porque sabia que não gostaríamos que o pessoal ao nosso redor brincasse conosco.

- Isso é demais. Você é demais. Nunca ouvi falar nisso, muito menos usei um.

Dobrou o bilhete com cuidado, colocou-o na caixa com o laço e a caixa de volta na minha bolsa. Colocou o controle remoto no bolso. Não demorou muito até que encontrasse o botão de ligar. Eu tinha esticado a mão para pegar meu café e quase derramei tudo quando, de repente, senti as vibrações lá dentro de mim. Olhei para Adam e ele sorriu.

Ele o deixou ligado e gradualmente aumentou a velocidade. Tentei ler o jornal, mas era impossível. Não conseguia me concentrar em nada e minha mão ainda tremia, o que fez com que levantar a caneca fosse um esporte perigoso.

Eu me inclinei e coloquei a cabeça em seu ombro, como se estivesse lendo o jornal com ele, mas na verdade eu estava me concentrando para não morrer. Não tinha como ter um orgasmo desses em público - torci para que não tivesse -, mas eu estava cada vez mais molhada e com vergonha. Eu me xinguei por ter inventado essa ideia imbecil. Comecei a ter memórias no estilo do filme Harry e Sally. Ninguém quer ter isso.

Cravei as unhas no braço dele e de repente tudo parou. Percebi o quanto estava tensa e finalmente relaxei, voltando ao meu lado do sofá. Respirava rápido, peito subindo e descendo. Ainda bem que não tinha ninguém sentado por perto. Podiam achar que eu estava tendo um ataque de asma.

Ele tirou a mão do bolso e virou a página do jornal. Começou a conversar comigo como se nada estivesse diferente. Fui voltando ao meu normal e comecei a relaxar enquanto terminávamos nossas bebidas. Nós nos levantamos e fomos para a saída. Quando ele abriu a porta para mim, não percebi que sua mão estava no bolso. Quando saí na rua ensolarada, senti um pulsar na minha vagina e quase tropecei, cheguei a soltar um pequeno berro agudo. Acho que ninguém percebeu, mas ele deu uma gargalhada, andando atrás de mim e imaginando como o filme seria divertido. A cara de louco poderoso dele me fez rir, apesar de eu estar me perguntando como ia conseguir me sentar durante um filme todo e me concentrar. Graças a Deus, escolhemos um filme popular cheio de explosões em vez de um filme cabeça.

Recebi mais algumas surpresas enquanto caminhávamos para o cinema, mas na maior parte do caminho ele me deixou em paz. Ele me agradeceu por dar tamanho controle para ele, mas avisou que não seria tão responsável, caso eu ainda não tivesse percebido.

Nós nos sentamos. Em um dia comum, fico irada com a quantidade de propaganda que colocam antes dos filmes, mas com Adam usando esse momento para me torturar, eu estava mais desesperada pelo começo dos trailers do que nunca. Ele apertava todos os botões e perguntava o que as diferentes combinações estavam fazendo comigo - vibrações constantes, pulsações etc. Expliquei da melhor maneira que pude, sussurrando por entre a mandíbula tensa, enquanto ele variava as programações.

Acho que teria sido mais fácil me concentrar se ele tivesse deixado o brinquedo vibrando, mas passou as duas horas seguintes me torturando. Fazia questão de mudar o estilo antes que eu me acostumasse à sensação, me levando à loucura e fazendo com que eu me segurasse nele de novo. Em um determinado momento, quando as explosões estavam tão altas que poucas pessoas no cinema sentadas perto de nós conseguiriam ouvir, ele se inclinou para sussurrar no meu ouvido e perguntou se eu estava molhada. Escondi meu rosto em seu ombro e fiz que sim com a cabeça.

Colocou a mão na parte interna de minha coxa e alisou mais para cima - ainda bem que os frequentadores de filmes aos sábados de manhã gostam mais de filmes para famílias, então não havia ninguém naquela fileira. Devagar, moveu o dedo para cima e para baixo na costura do meu jeans e disse que dava para sentir as vibrações. Foi quando dei um chute em sua canela. Já tinha passado do nível de me preocupar se ia ter problemas com isso, apesar de ele admitir mais tarde que mereceu minha punição. Tirou a mão de minha perna e a colocou sobre meus ombros. Manteve o controle na outra mão e fez de tudo para que eu não tivesse descanso. Nem vi o filme direito - ele acabou me dando o DVD mais tarde -, e quando terminou eu só conseguia pensar em uma coisa, e não era no preço elevado da pipoca do cinema. Finalmente, as luzes se acenderam. Ele estava sorrindo para mim.

- E aí. Quer fazer o que agora?

Durante um minuto, não consegui falar. O que ele achava que eu queria fazer?

- Almoço? - Ele estava se divertindo tanto. Não sei se o achei cativante ou irritante. A pulsação entre minhas pernas não me ajudava a escolher. No final, achei que ser educada contaria mais a meu favor.

- Podemos ir pra casa, por favor?

Ele fez carinho no meu braço com um dedo; tremi. Não havia como almoçar sem derrubar tudo. Depois de segundos longos e desesperadores, teve pena de mim.

- É claro que sim.

Ele deixou o ovo em uma programação constante durante o caminho todo para casa, mas o vibrador ainda pulsava enquanto eu andava, então não tinha como ignorá-lo, até porque pesava e se movia dentro de mim, causando ondas fortes de prazer.

Quando chegamos, ele desligou o ovo pela primeira vez em horas. Eu me dei conta de como estava molhada. Será que teria a chance de me arrumar e trocar de calcinha antes de ele decidir fazer alguma coisa maquiavélica comigo? Claro que não. Que otimista.

Assim que entramos na sala, ele veio para trás de mim. Suas mãos envolveram meu corpo e pegaram meus seios enquanto sua boca veio para meu pescoço e ombro, beijando e dando mordidas de leve. Foi como se estivesse esperando até o momento em que fechássemos a porta e tivéssemos privacidade. De repente, percebi que eu o estava atiçando sem querer, pelo mesmo tempo em que ele esteve me atiçando. Ele abriu meu jeans e o deslizou pelo meu quadril, e depois colocou a mão entre minhas pernas. Riu devagar.

- Sua calcinha está encharcada.

Tentei fechar as pernas, mas ele bateu nelas devagar, então deixei-as abertas. Ele me empurrou e me inclinou no braço do sofá, abaixando minha calcinha, que ficou nas pernas junto com o jeans. Pegou a corda fina de plástico que saía da minha boceta e a puxou. Fiquei sem ar quando o ovo foi parar na mão dele.

Em poucos segundos, estava sem ar de novo. Não o ouvi abrindo a calça nem o som familiar do preservativo sendo desembalado, e sem aviso ele se enfiou lá dentro de mim. Eu estava tão excitada que entrou com facilidade, mas dei um grito de surpresa e cravei as unhas na almofada quando ele começou a se mexer.

Colocou a mão em minha boca e pressionou alguma coisa contra meus lábios. Levei um segundo para perceber, mas era o ovo que tinha passado tanto tempo dentro de mim. Travei os dentes. Ele ficou parado por um momento e depois puxou meu cabelo em sinal de aviso. Abri os lábios e tomei meu brinquedo molhado na boca, provando meu próprio gosto. Continuou me comendo com força e não demorou muito para que também ficasse excitado e tivesse um orgasmo. Ele respirava com força quando se afastou para tirar a camisinha. Quando voltou, abriu a mão na frente de meu rosto e eu abri a boca, deixando o ovo na palma de sua mão.

Ele me ajudou a me sentar no sofá, afastou minhas pernas e se ajoelhou no chão na minha frente. Em segundos, estava me chupando. Assim como na primeira trepada, não teve preâmbulos nem preliminares, apenas a pressão decidida e firme no meu clitóris enquanto me lambia e sugava. Senti seus dedos entre minhas pernas e depois senti o brinquedo sendo introduzido de novo.

Ele o ligou e eu ergui meu quadril, me esfregando contra o rosto dele enquanto ele persistia no meu clitóris. Colocou o aparelho na vibração mais rápida e me lambeu várias e várias vezes. Segurei seus cabelos e gemi muito alto. Estava perdida.

- Por favor, posso gozar? — gemi. Eu sei. Não era uma coisa que eu costumava pedir se não recebesse uma ordem direta para isso, mas não ia arriscar uma interrupção por nada no mundo.

Ele fez que sim e continuou chupando. Eu me curvei para cima de novo e continuei segurando seus cabelos. Senti como se a língua dele estivesse vibrando quando gozei, gritando de prazer até me encostar no sofá de novo.

Ele afastou a boca e desligou o ovo antes de subir no sofá e se juntar a mim. Deitada com a cabeça no colo dele, eu me parabenizei pelo ótimo plano bem-executado. Posso dizer que Adam parecia estar tão satisfeito quanto eu, o que me deixou feliz e me fez sentir como uma deusa por um instante. Todo mundo sai ganhando.
http://mdemulher.abril.com.br/amor-sexo/reportagem/contos/leia-trecho-apimentado-romance-erotico-amor-submisso-753912.shtml

É meu!!!


Crianças que possuem demais
Elas já tendem a acumular muita tralha, não comece essa loucura antes mesmo delas nascerem, pelo bem delas e do planeta

Eu devia passar batido, mas ainda me chamam a atenção declarações de celebridades grávidas que, empolgadas no novo papel de mãe, se aventuram a dar entrevistas falando dos closets, do megaenxoval que trouxeram de Miami, das tantas roupas e dos tantos presentes que o bebê ganhou antes mesmo de nascer.

Tsc tsc tsc.

Se elas soubessem quanta tralha uma criança é capaz de juntar em pouco tempo, talvez fossem mais contidas na largada.

Bebês podem até triplicar de peso no primeiro ano de vida. Roupinhas e sapatinhos se perdem com muita facilidade. Há diversos sites especializados capazes de darem ótimas dicas sobre a quantidade ideal de fraldas, roupinhas e casaquinhos de que um bebê vai precisar.

Sapatos, aliás, são um desperdício. Bastam uns poucos pares para fazer graça para a plateia. Geralmente incomodam ou caem do pé.

Enfeites para o cabelo de meninas são outro problema. Neste verão inclemente do Rio, já vi bebês carecas na rua com faixas de pano tão largas que tapam (e abafam) metade da cabecinha. Deu dó. Deveriam proibir. Além do mais, não vale a pena comprar tanta coisinha. Eu, por exemplo, ganhei e comprei aqueles lacinhos para fixar com sabão de coco na careca do neném, além de presilhas delicadinhas, projetadas para penugens.

Minhas duas filhas nasceram com tanto cabelo que poderiam ter saído da maternidade com dreads. Melhor conhecer sua filha antes de se aventurar nesse gasto inútil. Costumo sugerir também que fujam daquelas bolsas fofas para carregar as coisinhas do neném que vão penduradas num ombro só. Gente, mochila! Ainda não inventaram nada melhor para deixar os dois braços livres.

É verdade que bebê golfa, fralda vaza, leite pinga. Haja troca de roupa. Só que não é esse desatino todo. Bebês não precisam de tanto, muito menos de um closet.

Aliás, ninguém deveria precisar de tanta coisa. E é disso que eu gostaria de falar: do consumo desenfreado. Uns chamam de fartura, mas é puro desperdício.

O excesso que pauta a ideia do que precisamos ter para viver está tirando a noção de muita gente. Desde que os sacos de pipoca quadruplicaram de tamanho passamos a acumular em casa e no corpo os excessos da vida insustentável. Consumimos e comemos demais. 

A obesidade como epidemia, inclusive entre crianças, é a prova material disso. Está faltando freio. Ostentar virou um modo de vida numa sociedade cheia de peças faltando. E abro um parêntese importante aqui para dizer que mania de acumulação não é privilégio dos ricos, muito menos dos famosos. 

Pode ser que as celebridades, depois das declarações públicas, promovam uma doação em peso de tudo que ganharam e, para não magoar ninguém, façam segredo disso. Vai saber.

O apego é um hábito ruim e democrático: assola pessoas das mais variadas classes. E não afetam só o fulano que pode se tornar um consumidor compulsivo eternamente insatisfeito, como até pesquisas mostram. Há males nesse comportamento que prejudicam todos ao redor.

Pesquisadores da Northwestern University (EUA) encontraram uma forte correlação entre indivíduos materialistas e um comportamento antissocial, egoísta e competitivo.  Segundo esse estudo, publicado em 2012, a tendência da pessoa materialista é apresentar um nível maior de ansiedade e insatisfação com a própria vida. 

São pessoas que costumam dar ênfase demais a si mesmas e não se envolvem de forma profunda e colaborativa com os demais, de acordo com os experimentos conduzidos por psicólogos e médicos.

O egoísta é aquele que depois vai, no mínimo, estacionar o carro na vaga de cadeirante ou de idoso sem pertencer a nenhuma das duas categorias porque “precisava urgentemente“. A urgência dele é sempre maior do que a do outro.

A identidade de uma pessoa não depende apenas de sua índole. Sofre influência do ambiente e da interação até circunstancial com os outros. Por um complexo sistema de trocas subjetivas é que o aprendizado acontece enquanto incorpora valores nos quais acredita. 

Se ela cresce acostumada à ideia de que precisa de muito, jamais saberá o que é lidar com pouco, não entenderá a diferença entre o que é e o que tem, desenvolvendo  grandes chances de buscar aceitação social por aquilo que possui.

Dosar as posses dos nossos filhos é algo que está em nossas mãos durante um certo (e curto) período da vida deles. É uma atitude que, por um lado, ensina um pouco sobre desprendimento e, por outro, auxilia na organização da própria vida. Cabe aos responsáveis estabelecer regras e apresentar propostas sadias para que o quarto do filho - e consequentemente a vida dele - não se torne um depósito infinito de tudo que ele irá ganhar durante a vida.

Crianças requerem atenção redobrada porque são seres em formação. Estão mais propensas a terem o foco desviado. Presas fáceis dos comerciais na televisão, conhecem todos os brinquedos que não têm. Querem quase tudo porque está para nascer o ser humano imune a tanto apelo. 

Ensiná-las nesse ambiente adverso dá mais trabalho. Passa pelo exemplo e pelo convencimento, ou você ouvirá da sua filha de quatro anos que seu armário também está cheio de roupas, quando a ela for negado um novo brinquedinho no mesmo dia em que você tiver comprado uma blusa.

Lá em casa, chegada a hora de se desfazer de brinquedos e roupas, sempre rolam discussões e argumentações que aos poucos constroem nas crianças um pouco dos princípios nos quais eu e meu marido acreditamos. É preciso abrir mão enquanto o brinquedo e a roupa forem úteis e bons a quem os herdar. Não podemos ter vergonha daquilo que estamos doando. E se sentir saudade depois daquilo que perdeu, ótimo, faz parte do crescimento também saber lidar com perdas.

Crianças que possuem demais sofrem do mesmo mal do adulto obrigado a fazer escolhas em demasia todos os dias. Não valorizam o que têm, perdem tempo e sentem-se perdidas.
Essa é a lógica que procuro empregar na minha vida, mas quem ouviu aquele disparate da filha de quatro anos fui eu.
http://epoca.globo.com/colunas-e-blogs/isabel-clemente/noticia/2014/02/criancas-que-bpossuem-demaisb.html

O circo já vai recomeçar...

A tragédia e a comédia na campanha eleitoral
Dilma é a Mônica. Cresceu com os mesmos dentinhos. Quando fica brava, ameaça com o coelhinho

A disputa pelo Palácio do Planalto rolará como um grande espetáculo cênico. Um espetáculo teatral, circense, midiático. As personagens já são mais ou menos conhecidas, cujos atributos mostram que o que vem por aí é um espetáculo meramente cômico.

A protagonista, claro, é Dilma Rousseff. Do alto de um sorriso que faz a delícia dos caricaturistas, a presidente lembra a Mônica das revistinhas de Mauricio de Sousa. Dilma é a Mônica que cresceu, virou gente grande e manteve os mesmos dentinhos. Quando fica brava, empunha seu coelhinho pelas orelhas e ameaça atirá-lo no interlocutor. O coelhinho é Guido Mantega, Mercadante ou quem estiver à mão.

Os antagonistas são dois. Aécio Neves, com seu sorriso eleitoreiro, tão branco quanto uma porta de geladeira, ainda não levou nenhuma coelhada contundente. É o ex-menino do Rio que gosta de usar gravata. Quando fica bravo, ninguém acha que fala sério – no caso de Aécio, uma grande vantagem. Quanto a Eduardo Campos, seu sorriso é um par de olhos azuis. 

Como em terra de cego quem tem olho azul é governador de alta popularidade, Campos tem passado incólume aos coelhos que voam. A toda hora, irrita a protagonista, mas sabe desconcertá-la. Quando fica bravo, amansa bem rápido – não brigará com possíveis aliados de segundo turno, que podem ser uns quaisquer ou qualquer uma.

Se a campanha eleitoral for mesmo uma encenação picaresca, ganhará quem souber trafegar no meio do circo sem exagerar na palhaçada. No picadeiro, o palhaço é indispensável, mas nunca é o herói. Sairá vencedor aquele que conviver bem com as piadas sem sucumbir a elas. O vitorioso poderá ser qualquer um dos três, embora a protagonista comece o espetáculo desfrutando indiscutível favoritismo.

A corrida presidencial também poderá rolar como espetáculo trágico. Aí, ganhará no final aquele que não morrer no meio, quer dizer, aquele que não se estatelar no ridículo ou no descrédito total, aquele (ou aquela) que não se queimar completamente.

Elementos que prenunciam a tragédia não faltam. Se o Brasil perder a Copa, teremos a possibilidade de enredo menos picaresco. Se os canarinhos forem mal, a narrativa política ganhará doses pesadas de frustração, mágoa, ressentimento, raiva e, quem sabe, revolta. É bom ficar atento a isso (os marqueteiros não pensam em outra coisa).

Em 2014, o palanque eleitoral será o desdobramento dos estádios de futebol. Mais ainda: será o prolongamento das ruas ocupadas pelos torcedores que não têm dinheiro para comprar ingressos. As eleições, portanto, devem vibrar na mesma frequência do final da Copa. O humor nacional estará nessa frequência.

A Copa e as eleições serão apresentadas na linguagem do entretenimento. Na mesma TV que mostrará os jogos, os candidatos aparecerão pedindo votos, embalados por musiquinhas melosas, com pose de gente boazinha, patriótica, abnegada. A mesma exaltação ufanista que embalará o show futebolístico estará presente no horário eleitoral, inteiramente moldado pela escola da melhor e da pior publicidade. 

Os chavões de Brasil grande, Brasil acolhedor, Brasil ecumênico, Brasil pacífico e Brasil feliz abarrotarão os pronunciamentos iniciais dos partidos. Agora, se a Seleção fracassar, se der vexame, bem, o roteiro terá de ser outro. Principalmente para quem é da situação. Vai ser interessante.

Não é só. Uma derrota no gramado será fichinha perto de um horizonte ainda mais tenso: o crescimento dos protestos de rua. Se as manifestações ficarem mais volumosas do que estão agora (elas estão voltando às praças públicas), aí, sim, poderemos nos despedir das esperanças de uma reles comédia eleitoral. 

Se a campanha presidencial tiver de conviver com multidões nas ruas, não apenas para bater palmas para a protagonista e seus dois antagonistas, mas para protestar contra a gastança de dinheiro público nos estádios, contra as mazelas da educação, contra a selvageria da tropa de choque, contra o descalabro da saúde pública e contra a roubalheira generalizada, o bicho vai pegar. O debate nacional terá menos efeitos especiais, menos musiquinhas idiotinhas e mais gosto de tragédia. Terá, talvez, um pouco mais de autenticidade.

Não que alguém aqui esteja torcendo para o Brasil perder a Copa. Essa torcida virá depois, talvez. Por ora, basta torcer por uma campanha eleitoral menos maquiada. Às vezes um destino trágico é o destino de quem tem um encontro marcado com sua verdade, sem esconder nada. Pense bem: esse encontro não faria mal ao Brasil.
http://epoca.globo.com/colunas-e-blogs/eugenio-bucci/noticia/2014/02/b-tragedia-e-comedia-bna-campanha-eleitoral.html

Anonimato terrorista...


Tirando a máscara
O capuz de Caio e o voto secreto no Congresso escondiam quem sabotava a democracia

A máscara é um disfarce. O capuz de Caio e o voto secreto do Congresso serviam para esconder o nome e o rosto de quem sabotava a democracia. Nem Caio nem os deputados queriam assumir seus atos diante da sociedade e da opinião pública. Tudo faziam para não se expor.

É natural que se tente disfarçar a autoria de um crime contra a vida ou um delito de consciência. No escurinho da máscara, na proteção do anonimato, seja aliciado, recrutado, manipulado ou favorecido, fica mais fácil explodir os valores, as crenças, os ideais e até a vida de um cinegrafista, de um manifestante, de um policial. Ou boicotar o futuro político de uma nação.

Agem todos como assaltantes da esperança num país melhor. Uns ganham R$ 150, quentinhas e vale-transporte, outros ganham milhões de dólares e a gratidão de poderosos. Até que a prisão de mensaleiros e a morte de Santiago acendem um rojão vermelho na cabeça de todos os brasileiros.

No velório de Santiago, as camisetas dos jornalistas traziam nas costas a inscrição: “Poderia ter sido qualquer um de nós”. É verdade. Vamos parar com o ciclo da violência e da ignorância acobertadas e financiadas por quem quer ver o circo pegar fogo. Chega de black blocs e white blocs mascarados! Chega de mártires como Amarildo e Santiago! E chega de corrupção premiada!

Chega de caçar jornalistas como se fossem bruxas! Desde junho de 2013, quando começaram as manifestações públicas, lindas, emocionantes e populares, houve 118 casos de violência contra jornalistas. Isso inclui agressões e prisões indevidas. Desse total, 88 atos de violência partiram de policiais, e 30 de manifestantes. Em 60% dos casos, as agressões não foram aleatórias. O jornalista se identificou. De nada adiantou. Ao contrário. Ao se identificar, o jornalista tem-se tornado alvo – e isso demonstra o medo das autoridades e o desconhecimento de parte da sociedade civil sobre como a imprensa realmente trabalha no Brasil.

Uma coisa é criticar a abordagem de um veículo de informação. Isso não só é legítimo, mas recomendável. Outra é assediar e tentar desmoralizar a imprensa em geral e seus profissionais. Ou, pior, tentar coibir a liberdade de informação. Isso equivale à censura, típica de regimes totalitários.

Com a cassação do deputado-presidiário Natan Donadon, por 467 votos a favor e uma abstenção, na primeira sessão de voto aberto na Câmara, o Congresso tira finalmente a máscara. Donadon mantivera o mandato anteriormente, em votação secreta, envergonhada e vexaminosa. Manter ativo o mandato de um deputado condenado pela Justiça é dar um tapa na cara do eleitor, traído por seus representantes fichas-sujas.

Houve hipocrisia populista em ano eleitoral? Prefiro celebrar esse momento histórico. De cara lavada, a ética se impõe. Se as máscaras do Congresso já tivessem sido tiradas antes, provavelmente não teríamos na presidência do Senado e da Câmara Renan Calheiros e Henrique Alves. O voto aberto nos renova a confiança num Congresso melhor.

Que os manifestantes imitem os congressistas. Que saiam às ruas sem máscaras e assumam seus atos, financiados ou não. Caio estava de rosto livre e feições indignadas no protesto contra o aumento das passagens de ônibus. Vestiu o capuz pouco antes de detonar a bomba caseira, em parceria com seu amigo Fábio Raposo, e fugir em disparada. Caio Silva de Souza, um sobrenome composto, tão brasileiro e tão comum. Um rapaz que desgraça a própria vida ao matar um profissional inocente, que estava na praça para registrar e mostrar a insatisfação popular com o alto custo de vida no Rio de Janeiro.

“Manifestações políticas são feitas por cidadãos que devem ter o orgulho e a responsabilidade de ser autores de seus gestos”, afirma o professor de Direito e formação político-econômica José Garcez Ghirardi. A máscara, segundo Ghirardi, serve como síntese para um desafio complexo das democracias: como legitimar as ações indivi­duais no espaço público? Indivíduo e cidadão são conceitos distintos, mas temos misturado tudo. Esquecemos assim a civilidade e favorecemos o arbítrio. Ghirardi cita o sociólogo francês Alain Touraine: “Uma sociedade de indivíduos pode destruir uma sociedade de cidadãos”.

Estamos a duas semanas do Carnaval. No Brasil, as máscaras dos foliões, que costumavam ser apenas divertidas, nos últimos anos se politizaram. Agora, em 2014, nessa festa tardia de março, uma das máscaras trará o rosto do pedreiro Amarildo, torturado e morto na Rocinha por policiais. Se os cinegrafistas filmassem o Carnaval com a máscara de Santiago, seria uma homenagem-protesto de imenso peso simbólico.

Nosso baticumbum pré-carnavalesco se reveste de drama épico. Esperamos que, no fim, a verdade e a transparência não sejam só fantasias. 
http://epoca.globo.com/colunas-e-blogs/ruth-de-aquino/noticia/2014/02/tirando-b-mascarab.html

Incompetência absoluta...


Um apagão no país ensolarado
Temos hidrelétricas, pré-sal, vento e sol de sobra. E, ainda assim, corremos o risco de racionamento de energia. Como chegamos a esse ponto?

O evento já ameaça entrar para o calendário oficial do brasileiro: entre o feriado de Ano-Novo, em 1° de janeiro, e o Carnaval, chega o dia de verão em que descobrimos estar sob risco de racionamento de energia pior do que gostaríamos. Neste ano, a efeméride caiu no início de fevereiro, quando o risco de racionamento para o ano chegou aos 6%. Não se trata de um limite oficial, mas o setor convencionou que, num sistema saudável, bem dimensionado e bem administrado, tal risco nunca deveria superar 5%. 

A desconfiança sobre o fornecimento de energia piora com episódios como a falha de transmissão ocorrida na terça-feira da semana passada, entre as regiões Norte e Sudeste. A pane deixou sem luz pelo menos 5 milhões de pessoas. Sob o piscar das luzes, o cidadão e contribuinte tem o direito de se incomodar. Num país com usinas hidrelétricas gigantes, como Itaipu e Tucuruí, com sol e vento fortes, reservas de gás natural e o petróleo do pré-sal, por que vivemos sob o espectro do racionamento?
SEM RESERVAS Represa em Bragança Paulista, São Paulo, com pouca água. A seca atrapalha, mas não é o maior problema (Foto: Moacyr Lopes Junior/Folhapress) 

SEM RESERVAS
Represa em Bragança Paulista, São Paulo, com pouca água. A seca atrapalha, mas não é o maior problema As reações do governo tendem a jogar a culpa no clima. É verdade que São Pedro não ajudou. Um período de tão pouca chuva sobre os reservatórios, como o iniciado no segundo semestre de 2013, só ocorreu em 2001, ano em que o governo federal teve de montar uma equipe para lidar com a crise – o “Ministério do Apagão”. 

Não se pode dizer, entretanto, que a seca atual seja extraordinária. “O cenário realmente coloca o sistema sob pressão. Mas ele precisa ter condições de aguentar essas situações atípicas”, diz Eduardo Bernini, ex-presidente da Eletropaulo. Nas últimas décadas, houve períodos com similar falta de chuva, sem que o fornecimento de energia ficasse tão ameaçado. 

Outras secas desse tipo virão no futuro. O problema verdadeiro surgiu, principalmente, por outros dois motivos, sem nenhuma relação com os desígnios da natureza. Nenhum deles admite soluções fáceis e imediatas, mas isso não desculpa os formuladores das políticas públicas para o setor. Nenhum dos dois surgiu do dia para a noite.

O primeiro dos motivos foi a decisão de não mais construir usinas hidrelétricas com grandes reservatórios, pela dificuldade do poder público em lidar com suas consequências – o deslocamento de populações das áreas afetadas e o impacto ambiental da inundação. 

Diante do ativismo de grupos indígenas, populações atingidas e ambientalistas, com apoio do Ministério Público e do Poder Judiciário, tornou-se difícil construir hidrelétricas com grandes reservatórios, como Itaipu, concluída em 1982. Por isso, nos anos 1990, a política para o setor mudou. Desde então, o parque hidrelétrico brasileiro cresceu com usinas do tipo fio d’água, que não exigem barragens nem quedas-d’água. 

As maiores usinas em construção hoje, Belo Monte e São Luiz do Tapajós, são do tipo fio d’água. Pela ausência de reservatórios profundos, as usinas da nova geração são mais vulneráveis a secas. “Não temos mais reservatórios porque o país tropeçou em problemas ambientais”, diz Luiz Fernando Vianna, presidente do Conselho da Associação Brasileira dos Produtores Independentes de Energia Elétrica (Apine). 

Nos anos 1970, num cenário hipotético em que os reservatórios estivessem cheios e parasse de chover completamente, o país ainda teria energia por quase dois anos. No início dos anos 2000, esse período de resistência a secas caíra para seis meses e, hoje, está em pouco mais de quatro meses. Por isso, diante de um período especialmente seco, como foi o último semestre, o país tem com que se preocupar.

Esse problema foi agravado por uma descoberta recente. Vários dos reservatórios antigos e profundos estão secando mais rapidamente do que deveriam. A falta de manutenção e o desmatamento do entorno têm levado terra e areia para esses lagos artificiais. “Os reservatórios já não têm mais tanta água quanto se imaginava, porque estão assoreando. 

Isso gera um problemaço”, afirma Edvaldo Santana, ex-diretor da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) (leia a entrevista aqui). A ausência de grandes reservatórios levou o país a uma via alternativa, que gerou um segundo problema – o segundo motivo que aumenta o risco de racionamento. Entre as várias fontes a que o país poderia recorrer, para complementar a hídrica, uma disparou à frente das outras. Tornamo-nos dependentes de usinas termelétricas.

Em comparação com as hidrelétricas, é rápido e barato construir usinas que gerem eletricidade a partir da queima de gás, óleo ou até carvão mineral – o trio de combustíveis fósseis poluidores. Construí-las também é mais simples e menos polêmico do que investir em energia nuclear, que, além de ser a opção mais cara, enfrenta as maiores resistências na área de segurança. 

As termelétricas também oferecem energia mais barata e confiável do que as principais fontes alternativas, como sol, vento e marés. O governo federal tem projeções animadoras para 2022, de aumento da importância da energia eólica e do gás natural, e de redução no uso de óleo. Mas 2022 está longe, e, no momento, a energia suja reina.

Até os anos 1990, essas usinas termelétricas eram vistas como uma forma de seguro para o sistema. Elas entrariam em ação só se tivéssemos algum problema com as hidrelétricas. No século XXI, o país se tornou dependente delas. A participação desse tipo de usina na capacidade total de produção de energia passou de 7%, em 2001, para 18% atualmente. 

“Elas se tornaram um seguro que usamos o tempo todo. Isso era previsível. Por isso, tínhamos de ter políticas para que elas se tornassem menos poluentes e produzissem energia mais barata”, diz o consultor João Carlos Mello, da Thymos Energia. 

A Apine, associação dos produtores independentes de energia, calcula que, a fim de tornar o sistema mais seguro, o país precisa duplicar a capacidade de geração das termelétricas baratas, cujo custo de fornecimento de 1 megawatt-hora (MWh) sai por R$ 150. Atualmente, para garantir o suprimento, temos de contar com termelétricas cujo custo de fornecimento fica acima de R$ 500 por MWh.

O custo mais alto chega ao consumidor de forma diluída. A conta relativa ao período de acionamento das termelétricas até agosto de 2013 será paga a partir deste ano. Nesse meio-tempo, o governo federal paga pela energia cara – é dinheiro queimado, em vez de ser usado para investimentos que tornem o sistema mais robusto no futuro. 

A maioria dos políticos e técnicos do governo hesita em confrontar interessados que assumem um discurso ambientalista e indigenista. A presidente Dilma Rousseff mostrou sua posição no ano passado. Num discurso sobre mudanças climáticas, ela alertou para o desafio das termelétricas e para a dificuldade de gerar mais energia hídrica. 

“Temos de enfrentar um fato: se continuarmos a fazer hidrelétricas a fio d’água, se continuarmos a ter a forma e também toda a arquitetura de energia renovável como temos neste momento, haverá uma tendência inexorável de aumento das térmicas em nossa matriz”, disse. Isso significa um fator de vulnerabilidade a secas e de poluição. Antes de resolver esses problemas complexos, há ações rápidas e mais fáceis de adotar.

Não se pode dizer que o parque energético brasileiro cresça pouco. Desde 2003, a capacidade de geração se expandiu, em média, 2,4% ao ano. É menos do que o necessário para uma economia em forte expansão, mas, infelizmente, não somos uma economia em forte expansão. Esse ritmo é o suficiente para acomodar o crescimento modesto que o país exibe. 

A rede de transmissão cresceu 3,8% ao ano no mesmo período. Os investimentos das estatais do setor, depois de passar por um achatamento entre 2002 e 2007, vêm crescendo. As declarações de incômodo de Dilma em 2013 diante do avanço das termelétricas deixam claro que essa expansão não garante ao país o sistema mais confiável possível.

Ainda falta ao governo federal encontrar uma fórmula que estimule o capital privado a entrar no jogo, sem que a energia se torne cara demais. Mudanças nas regras do setor, no ano passado, sob o pretexto de reduzir a conta de luz, praticamente paralisaram o investimento privado em transmissão. 

Além disso, a estrutura física do sistema aumentou mais rapidamente do que a capacidade de administrá-lo. Será necessário investir em redes inteligentes, e em maior capacidade de monitoramento, para que o sistema se torne mais confiável. Enquanto o governo não se entender com os investidores e ambientalistas, nossas luzes continuarão piscando. 
O Brasil à meia-luz (Foto: ÉPOCA)
http://epoca.globo.com/tempo/noticia/2014/02/bum-apagaob-no-pais-ensolarado.html

Atentado contra a sociedade ordeira...


Somos todos Santiago
O rojão que matou o cinegrafista Santiago Andrade atingiu cada um de nós. É preciso dar um “basta!” à escalada da intolerância e da violência nas manifestações de rua

Jornalistas são os olhos, ouvidos e vozes de uma nação. Olhos, ouvidos e vozes que trabalham para todos. É por meio dos olhos das câmeras que vemos o que acontece em locais distantes. Por meio dos ouvidos dos microfones que escutamos o que os outros têm a nos dizer. Por meio das vozes que narram as histórias que tentamos entender o mundo, compreender nosso tempo, alcançar um conhecimento modesto sobre o pouco que cabe a cada um de nós saber nesta vida. Sem olhos, sem ouvidos, sem vozes, restam apenas ignorância, escuridão, silêncio.

Qualquer ataque à imprensa é um ataque a esses olhos, ouvidos e vozes. Quem ataca a imprensa ataca olhos, ouvidos e vozes que trabalham para si próprio, que estendem sua própria visão, sua própria audição e sua própria voz. Quem ataca a imprensa não quer apenas cegar o outro – quer também ficar cego. Não quer apenas ensurdecer o outro – quer também ficar surdo. Não quer apenas calar o outro – quer também ficar mudo. 

Ser os olhos de todos nós era o trabalho do jornalista e cinegrafista Santiago Andrade, da Rede Bandeirantes de Televisão. Santiago foi atingido com um rojão na cabeça, enquanto trabalhava na cobertura de protestos contra o reajuste da tarifa de ônibus, no Rio de Janeiro na quinta-feira, dia 6 de fevereiro. Sua morte na última segunda-feira, dia 10, fez dele a primeira vítima a morrer num conflito provocado pela espiral de manifestações que tomaram o país desde as jornadas de junho do ano passado, quando milhões de brasileiros foram às ruas protestar inicialmente contra reajustes nas tarifas de ônibus, depois contra carências de toda sorte.
 A PRIMEIRA VÍTIMA O momento em que  o rojão atinge  o cinegrafista Santiago Andrade. A escalada  da violência nas manifestações fez  seu primeiro cadáver (Foto: Agência O Globo)
A PRIMEIRA VÍTIMA 

O momento em que  o rojão atinge  o cinegrafista Santiago Andrade. A escalada da violência nas manifestações fez  seu primeiro cadáver.

Desde então, as manifestações minguaram em participação e passaram a ser monopolizadas por grupos de ativistas violentos – entre os quais praticantes da tática anarquista conhecida como black bloc. 

Eles transformaram em meta o vandalismo contra governo, polícia, imprensa, bancos, estabelecimentos comerciais, monumentos – e tudo aquilo que possa estar associado às instituições democráticas. Não é uma atitude desprovida de racionalidade, como lembra o cientista político Fernando Luís Schüler, em artigo na edição de ÉPOCA desta semana. Trata-se de uma ideologia antiga e tosca, inaceitável num Estado democrático de direito. Ela procura justificar a violência como reação à “violência do Estado” e inspira a ação dos ativistas, recrutados entre jovens com amplo acesso à internet, formação intelectual de menos – e irresponsabilidade de mais.
http://epoca.globo.com/tempo/noticia/2014/02/somos-todos-bsantiagob.html

Abuso na caruda...

Preços nas alturas por toda a cidade fazem surgir o ‘Verão da farofa’

Um balanço dos preços abusivos de produtos triviais no rio, das explicações de quem os vende e de como o carioca dribla esta alta

RIO - O caju não é mais o amigo de outrora. O brasileiríssimo fruto com dez centímetros de pura suculência está custando R$ 5 — a unidade.

— É que o caju vem de avião lá do Piauí. Além do frete ser caro, trata-se de uma fruta delicada, correndo-se o risco de parte do lote ser perdida na viagem — justifica-se Osvaldo Rodrigues Meira, diante de uma freguesa de pé em frente à sua barraca, na Cobal do Leblon.

Mas não é só pelos R$ 5. Além de frutas tropicais, outros itens da “cesta básica” carioca — definida nesta reportagem como um conjunto de produtos triviais consumidos no dia a dia, que podem ser encontrados em diferentes lugares da cidade — andam custando pequenas fortunas. É o tipo de coisa que não dá nem para botar a culpa na alta do dólar: água de coco a R$ 7, sorvete de casquinha a R$ 11, frango de padaria a R$ 29, Havaianas a R$ 38,80, biquíni a R$ 460.

‘Não somos um bando de ranzinzas’, diz criadora de página do $urreal no Facebook

Revoltados com preços altos no Rio, internautas criam moeda $urreal, com imagem de Salvador Dalí

No verão marcado pelos surreais misto quente de R$ 20 (em cartaz no cardápio de uma barraca nas areias de Ipanema), pirão de R$ 50 (à venda em Guaratiba) e omelete de R$ 99 (do menu de um restaurante na orla de Copacabana), a Revista O GLOBO saiu à caça de preços de itens de “primeira necessidade” e das justificativas de quem os vende. Sobrou para a Copa do Mundo que se aproxima, para a vista privilegiada, para o Choque de Ordem da prefeitura.

É que a partir deste fim de semana, comerciantes oportunistas vão precisar se explicar para os 80 fiscais da operação “Consumidor, essa praia é sua”, realizada pelo Procon Carioca em parceria com a Secretaria de Ordem Pública, que vão percorrer as areias do Flamengo ao Recreio justamente para frear a escalada de preços. É a primeira iniciativa da Frente Municipal de Combate às Práticas Abusivas, criada pelo prefeito Eduardo Paes na última quarta-feira.

— O barraqueiro que vende um misto quente a R$ 20 vai ser notificado e terá cinco dias para se justificar. Se a resposta não for convincente, poderá ser multado ou até perder a licença para trabalhar na praia. Os comerciantes precisam voltar para a realidade — avisa Solange Amaral, secretária de Defesa do Consumidor e coordenadora do Procon Carioca.

Enquanto o Procon não vem... Osvaldo, que vende cajus piauienses na Cobal do Leblon, planeja aumentar o preço da caixa com três unidades de R$ 15 para R$ 20 na temporada pré-carnaval. Na feira da Praça General Osório, em Ipanema, uma caixa igualzinha era vendida a R$ 10, terça-feira passada. Chorando, chegava-se a R$ 8. Nas prateleiras do Hortifruti, a mesma embalagem sai a R$ 12,99.

— A fonte está rareando, e o pessoal adora comprar caju para fazer caipirinha nesta época do ano. A minha freguesia não reclama do preço. É aquela história: quem tem dinheiro compra, quem não tem, conta história — desdenha Osvaldo.

Para o economista Luís Carlos Ewald, da Fundação Getúlio Vargas (FGV), o consumidor é o grande responsável pela alta de preços na cidade.

— Se o feirante botar a caixa de caju a R$ 15 e ninguém comprar, ele vai ter que baixar. Mas as pessoas são perdulárias — lamenta Ewald. — Qualquer coisa, por mais simples que seja, tem que ter um preço justo. Os donos dos estabelecimentos vão justificar os valores pelo IPTU? Pode ser, mas se não há venda não há dinheiro para pagar impostos. É uma cadeia. O problema é o abuso dos comerciantes somado ao corpo mole dos consumidores.

No calor da estação, o sorvete vale ouro. Na La Basque, no Leblon, uma bola, na casquinha ou no copinho, custa R$ 11. É o mesmo preço da porção de 90 gramas da novíssima gelateria Momo — que utiliza pistache do Bronte, leite de coco da Tailândia e tapioca de Belém no preparo dos gelados —, e mais caro do que na Mil Frutas (R$ 10) e na Sorvete Brasil (R$ 9).

Para o economista Gustavo Franco, professor da PUC-Rio, a cidade está vivendo uma típica inflação de verão:

— Preços de produtos sazonais, como coco, mate e chinelo de dedo, costumam aumentar no verão e diminuir no inverno. Mas, como a cidade está vivendo um verão espetacular, os preços subiram ainda mais. A água de coco deve estar um absurdo...

Um absurdo entre R$ 5, nas barracas da orla de Copacabana e da Barra, e R$ 7, em Ipanema.
— Há 20 anos, quando foi introduzida a URV (a Unidade Real de Valor), um dos primeiros produtos convertidos foi o coco. Custava R$ 1 porque arredondamos para cima — lembra o autor do livro “O Plano Real e outros ensaios”.
O barraqueiro Leandro Raggio, que trabalha num dos metros quadrados de areia mais disputados da orla, no Leblon (olha ele aí de novo...), explica por que cobra R$ 6 pelo coco:

— Após o início do Choque de Ordem, vários fornecedores debandaram. Tínhamos uns cinco de coco, mas, agora, só nos resta um. Resultado: ano passado pagávamos R$ 0,70 pela unidade que, atualmente, custa R$ 2,80.
Outro clássico carioca, o frango de padaria anda salgado além da conta. Na Rio Lisboa, no Leblon, uma peça de 1,2kg custa R$ 20. No Farinha Pura, no Humaitá, R$ 24,90, o quilo. Diretora executiva do estabelecimento, Lícia Vidigal enumera os “diferenciais” do Farinha Pura:

— Os frangos são assados em modernos fornos que utilizam uma injeção de vapor que os torna mais macios, nutritivos e saborosos. Antes desse processo, eles são marinados no vinho branco seco pelo período de quatro horas.

Itens essenciais no enxoval praiano de toda mulher, o biquíni e o chinelo estão com preços que estimulam o naturismo. Enquanto na areia as roupas de banho são vendidas por ambulantes por R$ 50, em média, nas lojas de grife um duas peças pode custar até nove vezes mais. Na Vix, por exemplo, começam em R$ 320 e vão até R$ 398. Na Lenny, o mais caro sai a R$ 460.

— O modelo tem calça hotpant, que além de ser todo duplo leva uma faixa enorme. Nossos biquínis estão com preços compatíveis ao mercado. O de lacinho, por exemplo, não sofre alteração há três anos — explica a estilista Lenny Niemeyer.

No mercado AAA, paga-se ainda pelo design e pela marca. Mas e a sandália de borracha? Não dá nem para botar na conta do luxo. Nas prateleiras do Mundial, um par de Havaianas com estampa de bolinhas está custando R$ 38,80, conforme denunciou um usuário do Facebook na página colaborativa Rio $urreal. Procurada pela reportagem, a assessoria de imprensa do supermercado alegou que o responsável pela compra do produto está de férias e que ninguém mais poderia explicar o fato. Nas lojas das Havaianas, o mesmo modelo sai por R$ 29,90.

Por outro lado, o supermercado ainda é o melhor lugar para abastecer o isopor a caminho do mar. A mesma garrafa de Stella Artois, de 275ml, que é vendida a R$ 2,49 nas gôndolas do Mundial, custa R$ 13 no Azul Marinho, bar e restaurante com mesas no calçadão do Arpoador.

— Paga-se pela localização: o cliente do Azul Marinho toma a cerveja geladinha com o barulho das ondas — justifica Marcos Farias, gerente da casa. — Não há dinheiro que pague essa vista.

Levando-se em conta que a vista é gratuita... A comerciária Jeane Ursulino, de 56 anos, não pagou ingresso para assistir ao espetáculo do pôr do sol acomodada sobre sua canga nas areias do Arpoador, em frente ao Azul Marinho, sexta-feira retrasada. Estimulada pelas correntes de boicote aos preços abusivos compartilhadas em sua timeline no Facebook, Jeane convocou três amigas, comprou duas dúzias de cerveja, um pacote de amendoim e um punhado de gelo.

— Gastamos R$ 17 por pessoa para tomar umas cinco cervejas, cada. Já tinha ido ao Arpoador em vários outros fins de tarde, mas foi a primeira vez que fiz a farofa completa! — diverte-se.

A poucos metros dali, outros grupos brindavam ao pôr do sol com bebidas acomodadas em baldes, bolsas térmicas, isopores. A mudança de hábito é geral: o carioca está usando o seu famoso jeitinho para driblar os preços e fazer deste o Verão da Farofa.

Em muitos casos, a farofa é chique. A designer Analu Reis, de 32 anos, e a empresária Thays Castro, de 45 anos, costumam levar garrafas de vinho branco e nuts para piqueniques na areia. Carregam tudo em bolsas térmicas. Para completar, têm sempre uma caixa de som para acoplar no iPhone.

— É economia com glamour — diverte-se Analu, que prefere comprar uma garrafa de vinho de R$ 18 no Zona Sul a desembolsar R$ 20 por quatro latinhas de cerveja. — O vinho vale muito mais, e cerveja ainda dá barriga.

A chef Karen Couto entrou na onda do isoporzinho em busca de uma praia mais saudável. Para dar uma estilizada na “farofa detox”, ela vestiu o isopor velho de guerra com plástico verde. No cardápio, tirinhas de cenoura e pepino com molho de iogurte sem lactose e tomatinhos cereja com torradas sem glúten. Para beber, chá termogênico à base de ervas. O farnel custou R$ 15.

— É uma questão de qualidade de vida. Na Europa, as pessoas fazem piquenique em praias, parques, praças — compara Karen.

Em terras cariocas, aos poucos, a moda está dando o ar de sua graça também fora da praia: o entorno da Lagoa Rodrigo de Freitas e a Praça São Salvador, em Laranjeiras, já abrigam adeptos do gastar menos é mais.

O responsável pela glamurização do isopor é o VJ Guigga Tomaz, de 28 anos. Indignado pela alta do preço da cerveja em seu bar de estimação, ele fez um desabafo no Facebook que virou o evento Beber no Isoporzinho. Desde então, já ocorreram mais de cinco edições em distintas praças cariocas, além de ter inspirado versões em Belo Horizonte, Salvador e Manaus.
— É o resgate, por necessidade, de um símbolo da minha infância — diz.

Duas semanas atrás, o Beber no Isoporzinho ocupou o Largo dos Leões, no Humaitá. Foram mais de 80 pessoas. Entre elas, chamava a atenção o grupo de adultos acompanhado pelo menino Mateus Lima, de 8 anos, que levou uma bolsa térmica com picolés e uma garrafa de H2O.

— Temos que protestar, se não a latinha de cerveja vai custar R$ 17 na Copa — disse o garoto, com apoio da mãe.

Ali do lado, a rodinha do advogado Rafael Zavos, de 37 anos, compartilhava coxinhas com os vizinhos de isopor.

— Estamos lançando a bandejinha — anunciou Rafael, gaiato. — Como estamos na Zona Sul, chamam o que estamos fazendo de movimento de vanguarda. Mas, na verdade, somos todos farofeiros, com muito orgulho.

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Mais uma etapa superada...