Como a vida de Einstein pode inspirar a nossa
Seu nome se tornou sinônimo de genialidade. As
razões para isso são muitas, mas talvez a principal seja sua capacidade de
levar o Universo inteiro dentro da cabeça.
Talvez não exista tarefa mais difícil do que
tentar dizer o que podemos aprender com Albert Einstein. Primeiro porque são
muitas coisas. Segundo porque são profundas. E terceiro porque tem tantas
facetas que é difícil espremer a fruta até ficarmos somente com o suco - que é,
como talvez diria Einstein, a única coisa que o tempo e o espaço nos permitirão
abordar aqui.
A vida e a obra de Einstein em essência
demonstram quanto vale a reflexão cuidadosa e como precisamos nos despir de
preconceitos. Desde jovem até o fim de sua vida, o físico pregou a necessidade
de não tomarmos o discurso vigente pelo seu valor de face. É verdade que ele
também demonstrou certos compromissos ideológicos, ao, por exemplo, abraçar a
constante cosmológica apenas para conformar sua teoria ao que ele achava que
ela deveria dizer sobre o mundo. Da mesma maneira, e por motivos similares, ele
passou praticamente a vida toda renegando as consequências da mecânica
quântica, que transformara o Universo numa série interminável de eventos
probabilísticos, não deterministas. Para ele, o mundo não poderia ser, em sua
natureza mais elementar, desse jeito.
Contudo, convicções como essa são inofensivas
e até benignas. Um ser humano sem nenhuma convicção também não serve para nada.
O ideal é que ele tenha pelo menos a convicção de que convém desconfiar de
convicções. E Einstein seguramente tinha isso.
Sempre que estamos diante de uma situação que
nos parece obviamente apontar numa dada direção, rumo a uma certa
interpretação, cabe lembramos disso e darmos um passo atrás. Será que há espaço
para desafiarmos nossas convicções? Será que há um ponto de vista alternativo?
Será que a verdade está nos olhos de quem vê? Seria ela relativa?
Esse é um ponto fundamental do pensamento de
Einstein, que nos leva diretamente a algumas de suas qualidades humanistas mais
marcantes: o profundo pacifismo e a crença no internacionalismo. A noção de que
a guerra nunca é a resposta para nada e que estamos todos irmanados neste
planeta numa civilização só, ligados por laços que não podem ser desfeitos, por
mais que tenhamos costumes tribais enraizados de separar o mundo entre
"nós e eles".
Outra coisa que encanta na postura de Einstein
tem a ver com sua capacidade de resolver problemas e propor soluções,
baseando-se nas premissas mais simples. Os famosos gedankenexperimenten - os
experimentos mentais que o físico fazia para explorar as questões que o
intrigavam - mostravam exatamente como ele procedia ao investigar a natureza:
com os olhos de uma criança, que tenta entender o que vê e o que a cerca,
despida de preconceitos. É aquela "ingenuidade do bem", que permite
enxergar através das camadas espessas de imposição cultural, e para a qual, não
importando a nossa idade, sempre deveríamos guardar um espacinho dentro de nós.
Einstein acreditava que a mentalidade infantil
representava o espírito científico em seu estado mais puro, a capacidade de
inquirir sem se sentir tolhido de maneira alguma. Acreditava também que vamos
perdendo ao longo da vida essa capacidade, justamente por nos afundarmos sob o
mundo adulto, cheio de ideias preconcebidas. Como forma de combater esse
afundamento e manter aflorado o poder de questionar, Einstein apostou no poder
das respostas simples e ao mesmo tempo profundas. "Se você não pode explicar
de forma simples, você não entendeu", ele dizia.
Ironicamente, a teoria da relatividade geral,
em sua formulação matemática, é uma das coisas mais difíceis que já se produziu
em física. O que mais uma vez atesta o poder do gênio em enxergar o simples em
meio às complicações. Esse é um exercício salutar em todas as estradas da vida:
buscar entender a essência, o simples, de cada situação nos ajuda a nos
posicionarmos melhor, enfrentarmos com mais vigor as dificuldades e abraçarmos
com mais facilidade os prazeres que elas nos oferecem.
Por fim, não podemos deixar de destacar que
essa capacidade emerge muito mais fácil quando encontra genuíno respaldo em
nosso mundo mental interno, quando faz parte do nosso próprio modo de pensar.
Para entender isso, basta ver em que circunstâncias Einstein se tornou a mais
poderosa força de transformação na física. Aconteceu em 1905, em seu "ano
miraculoso", quando o cientista trabalhava no escritório de patentes em
Berna, lidando com burocracia mais do que com qualquer outra coisa. Note que
sua produção científica não emergiu de seu emprego; partiu de sua necessidade
criativa de investigar os problemas da natureza, a despeito de não contribuírem
em nada para sua vida profissional naquele momento. Em resumo: Einstein
praticava física porque tinha paixão por ela, não porque isso fosse exigido
dele profissionalmente.
É uma demonstração cabal de que devemos sempre
abraçar nossas vocações e não desistirmos delas mesmo quando as circunstâncias
parecem apontar noutra direção. Note que não se trata de abandonar o sistema
quando ele não lhe favorece, simplesmente se rebelar e cair num niilismo.
Einstein, como todos nós, tinha contas a pagar no fim do mês e estava grato
pelo emprego, ainda que não lhe trouxesse a mínima satisfação pessoal. A
sabedoria dele foi permanecer lá, mas não permitir que aquilo o levasse a
perder de vista onde estava o seu coração. O resultado foi uma das carreiras
mais brilhantes e bem-sucedidas já vistas na história da ciência. Até hoje,
quando falamos em gênio, pensamos em Einstein. Não por acaso.
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