Como os
pássaros conseguem dormir em pleno voo sem cair?
Cientistas acoplaram dispositivos em fragatas
de Galápagos para monitorar seu sono durante o voo
Muitas aves voam centenas de quilômetros sem
tocar a terra. E só conseguem isso porque conseguem dormir em pleno voo.
Mas como elas conseguem fazer isso?
Essa questão gerou dúvidas durante décadas até
ser finalmente respondida por um cientista alemão e seus colegas após uma
pesquisa nas ilhas Galápagos.
Niels Rattenborg, do Instituto Max Planck de
Ornitologia na Baviera, Alemanha, coordenou a equipe que demonstrou pela
primeira vez que as aves dormem quando voam e que isso ocorre por períodos
muito breves.
Às vezes elas dormem com um hemisfério
cerebral acordado e outras vezes dormem nos dois hemisférios. Mesmo assim
conseguem manter o controle aerodinâmico.
Sebastián Cruz, um biólogo equatoriano
especializado em aves marinhas, é coautor do estudo. Ele desempenhou um papel
determinante na escolha da espécie que seria estudada: a fragata de Galápagos.
Por que
fragatas?
As fragatas (fragata minor) "se
alimentam exclusivamente no mar e realizam viagens de vários dias de duração
sem parar, sempre voando", disse Sebastián Cruz à BBC Mundo, o serviço em
espanhol da BBC.
Niels Rattenborg, à dir, de Instituto Max
Planck de Ornitologia, estudou o sono em humanos por dez anos antes de se
dedicar às aves
A razão mais importante para a escolha é que
"ao contrário de outras aves marinhas, as fragatas não conseguem descansar
na superfície do mar, já que suas penas não são impermeáveis e podem absorver
água".
Elas também são grandes o bastante para
suportar o peso de um leitor de ondas cerebrais e um GPS.
As fragatas precisam percorrer grandes
distâncias para se alimentar.
Fragatas podem dormir só 42 minutos por dia.
Cruz disse que elas tentam cobrir a maior
área possível em busca de comida no mar, voando em um grande círculo para
gastar a menor quantidade possível de energia.
Dessa forma, aproveitam correntes de ar e se
beneficiam de sua morfologia peculiar: um corpo pequeno e asas muito grandes.
"Elas empregam uma estratégia de voo
lenta, mas eficaz. Ganham altitude, centenas de metros, com correntes de ar
ascendentes e depois se deslocam para a direção que querem planando de forma a
ganhar distância e perder altitude."
Partes do
cérebro
Os dispositivos mostraram que as fragatas
conseguem dormir de maneiras diferentes, segundo Niels Rattenborg.
"Um jeito é chamado de sono de ondas
lentas, porque o cérebro gera esse tipo de onda que pode ser detectada em um
eletroencefalograma", explica.
Esse tipo de sono pode ocorrer em ambos os
hemisférios cerebrais ou em apenas um. Quando ocorre em apenas um se chama sono
uni-hemisférico. Nele, o olho oposto ao hemisfério cerebral permanece aberto.
Em um estudo anterior, Rattenborg já havia
demonstrado que os patos que estão na parte mais externa de um grupo, expostos
a perigos, dormem com um um olho aberto. Aqueles que estão no centro do grupo,
mais seguros, dormem com os dois hemisférios de uma só vez.
O segundo tipo de sono que as aves podem ter
é o sono de movimentos oculares rápidos, ou REM, de ondas mais curtas e
rápidas.
Menos de
cinco segundos
"Muitos pensavam que as aves dormiam só
de forma uni-hemisférica", disse Rattenborg.
Mas os registros de ondas cerebrais mostraram
que as fragatas também podem dormir com os dois hemisférios simultaneamente.
Itinerários de fragatas.
As fragatas têm que passar muito tempo voando
em busca de alimento no mar; um dispositivo GPS registrou suas trajetórias
"Não sabemos exatamente como o fazem.
Talvez usem um mecanismo similar ao que lhes permite dormir quando estão
paradas. No caso das fragatas, isso significa que conseguem dormir enquanto
mantêm suas asas em posição de planar", disse o cientista alemão.
Ele disse ainda que foi uma surpresa
descobrir que as aves também têm sono REM - embora esse estado dure em média só
cinco segundos.
42
minutos de sono por dia.
Somando todos os tipos de sono, as fragatas
dormem em média 42 minutos por dia.
"Isso foi inesperado. Se conseguem
realizar tantos tipos de sono ao voar, por que dormem tão pouco?",
questiona Rattenborg.
"Neste momento realmente não temos
ideias sólidas para explicar como as fragatas se adaptaram a funcionar com tão
pouco sono, enquanto tantas outras espécies, de abelhas a humanos, sofrem
dramaticamente as consequências da falta de sono."
Estudo do sono das fragatas pode ajudar a
entender sono humano
O pesquisador destacou que uma pesquisa sobre
os mecanismos de adaptação dessas aves pode também ajudar a entender o impacto
da falta de sono em seres humanos.
"Baseando-se em nosso estudo do sono
uni-hemisférico dos patos, Masako Tamaki e seus colegas (da Brown University
dos Estados Unidos) publicaram um trabalho explicando que quando as pessoas
estão em um ambiente novo, o hemisfério esquerdo dorme de forma menos profunda
e responde mais a sons que o hemisfério direito, somente na primeira
noite", diz.
"Isso sugere que, como os patos, os
seres humanos têm a capacidade de acordar ao menos parcialmente a metade de seu
cérebro em resposta a circunstâncias potencialmente arriscadas."