A
Cultura Deve Ser Uma Descoberta Individual de Cada um de Nós
Não
se deve intervir, não nos devemos meter nos problemas que cada um tem com a
leitura. Não devemos sofrer por causa das crianças que não leem, perder a
paciência. Trata-se da descoberta do continente da leitura. Ninguém deve
encorajar nem incitar outra pessoa a ir ver como ele é. Já existe excessiva
informação no mundo acerca da cultura. Devemos partir sós para esse continente.
Descobri-lo sozinhos. Operarmos sozinhos esse nascimento.
Por exemplo, em relação a Baudelaire, devemos
ser os primeiros a descobrir o seu esplendor. E somos os primeiros. E, se não
formos os primeiros, nunca seremos leitores de Baudelaire. Todas as
obras-primas do mundo deveriam ser encontradas pelas crianças nos despejos
públicos, e lidas às escondidas dos pais e dos mestres.
Por vezes, o facto de se ver alguém a ler um
livro no metro, com grande atenção, pode provocar a compra desse livro. Mas não
quanto aos romances populares. Aí, ninguém se engana quanto à natureza do
livro. Os dois géneros nunca estão juntos nas mesmas mãos.
Os
romances populares são impressos em milhões de exemplares. Com a mesma grelha
aplicada, em princípio, há uns cinquenta anos, os romances populares
desempenham a sua função de identificação sentimental ou erótica. Depois de os
terem lido, as pessoas abandonam-nos nos bancos públicos, no metro, e serão
apanhados por outras pessoas e novamente lidos. Isso será ler?
Sim,
penso que sim, é ler como se toma um remédio, mas é ler, é ir buscar a leitura
ao exterior de si próprio e ingeri-la e fazê-la sua e dormir e cair no sono
para, no dia seguinte, ir trabalhar, juntar-se a milhões de outras pessoas, a
solidão matricular, o esmagamento.
http://www.citador.pt/textos/a-cultura-deve-ser-uma-descoberta-individual-de-cada-um-de-nos-marguerite-duras
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