"É só sertanejo, pagode. O Brasil emburreceu devido à
monocultura", diz Guilherme Arantes
Guilherme Arantes lança "Condição Humana (Sobre o Tempo)",
novo disco de inéditas após sete anos.
Um sentimento de estranhamento com o mundo. Essa foi a mola
propulsora para "Condição Humana (Sobre o Tempo)", que marca a volta
de Guilherme Arantes após sete anos sem um disco de inéditas.
O cantor que imortalizou temas ecológicos ("Planeta Água") e baladas românticas ("Cheia de Charme") afirmou, durante entrevista ao UOL, que o Brasil vive hoje uma nociva "monocultura".
O cantor que imortalizou temas ecológicos ("Planeta Água") e baladas românticas ("Cheia de Charme") afirmou, durante entrevista ao UOL, que o Brasil vive hoje uma nociva "monocultura".
"Existe esse cenário de balada em um país infantilizado como
Brasil, um país que perdeu a profundidade. Agora é uma coisa rasa, é só festa.
É só sertanejo, pagode. É só cana, laranja e boi. O Brasil emburreceu devido à
monocultura", afirmou.
O raciocínio do compositor se alongou em mais de uma hora de entrevista,
onde ele explicou que a monotonia invadiu não só as paradas de sucesso, mas
todo o país. Na parte cultural, no entanto, algo começou a mudar quando um
grupo de "excluídos", que antes consumiam o que "a TV
aristocrata produzia", passa a determinar o dial da rádio e o tema da
novela.
"Foi uma inserção no mercado de uma massa de excluídos, grupos que
não participavam, não apitavam. São goianos, são sertanejos, é o mundo da
agromúsica. Houve essa inclusão das festas populares. Você tem a ascensão de
uma classe média negra, que é quando surge o pagode; da classe média baiana,
que dá no axé; de Goiânia com o sertanejo, e agora com o Pará", explica.
Ele pondera, cuidadoso: "Eu olho com naturalidade e alegria
(essa inserção). O Brasil canta música brasileira, antes de
mais nada. O que é criticável é o pragmatismo desse mundo globalizado. Nós
temos regiões do país onde ninguém sabe quem é Milton Nascimento".
Para escapar do desânimo que o assolou, Guilherme construiu – da
concepção até a instalação dos cabos elétricos - o Coaxo do Sapo. Metade estúdio,
metade pousada, é na Bahia onde Guilherme se retirou para "oxigenar
ouvindo outras coisas". "Mais do que minha carreira, estou
estrategiando a música. Isso deu um gás pra fazer esse disco".
Embora "Condição Humana" seja um disco para cima, com canções
de amor e uma produção que resgata o pós-progressivo dos anos 1970, Guilherme
se permite fazer uma análise social: "Faz-de-conta que eu não sei / Que o
mundo está na mão / Da quadrilha de gravata / Que me assalta todo mês",
canta na nova "Moldura do Quadro Roubado".
"Eu resolvi fazer um disco pra colocar para fora essa visão de um
mundo que me preocupa. Você liga a TV e só tem religião. Você vira canal e só
tem igreja. O que é isso? Nosso dial é uma vergonha. Nossa televisão está
alugada para pastor", diz.
Sobre o Tempo
Com o segundo título do disco, "Sobre o Tempo", Guilherme revela um lado mais positivo e colaborativo nesse novo e estranho mundo. Venerado por artistas alternativos da dita nova MPB, o compositor abriu as portas para conversar com seus contemporâneos, e foi direto no convite: "Estava decidindo os coros para as músicas e pensei: podia juntar todo esse pessoal que diz gostar de mim", conta.
Com o segundo título do disco, "Sobre o Tempo", Guilherme revela um lado mais positivo e colaborativo nesse novo e estranho mundo. Venerado por artistas alternativos da dita nova MPB, o compositor abriu as portas para conversar com seus contemporâneos, e foi direto no convite: "Estava decidindo os coros para as músicas e pensei: podia juntar todo esse pessoal que diz gostar de mim", conta.
Deu certo. Mariana Aydar, Adriano Cintra, Kassin, Curumin, Bruna
Caram, Thiago Petit, Tiê e Tulipa Ruiz, entre outros, cantam em "Onde
Estava Você" e "O Que Se Leva" - com Marcelo Jeneci, que também
toca acordeão nesta última, Guilherme guarda um carinho especial: "A gente
tem uma ligação que é um algo mais. Tem algo que me liga profundamente com
ele."
Dessa lista, faltou Mano Brown, fã confesso de Guilherme. "Ele é um
poeta monstro. Mas a gente também tem motivos santistas para ter esse
entusiasmo", brinca.
Com o frescor desses contatos, o compositor diz enxergar uma esperança.
"Esses jovens trazem de volta o piano, que é um instrumento aristocrático,
é uma galera que está procurando uma música mais densa. É uma geração que está
trazendo de volta a harmonia".
Além de um desafio: "Todo mundo fala que o Jeneci é meu
sucessor, que o Silva é minha extensão. Isso me deu a gana de dizer: opa, não estou
morto, não. E isso é bom. Pela primeira vez, tenho concorrentes.", diz aos
risos.
Guilherme renega a ideia de que está sendo, finalmente, redescoberto –
"estou sendo redescoberto há anos" -, e reafirma que sua verve
melódica e romântica finalmente venceu uma batalha iniciada nos anos 1980, com
o que ele chama de "música feita para homens".
"Minha música surgiu, agradou do ponto de vista da mulher e
desagradou aqueles homens de coturno, aquela coisa que parecia a juventude
hitlerista. Trinta anos depois, eu dou o troco. O rock masculino ficou pra trás,
hoje são um bando de homem chato e machista. A transgressão mais forte foi a
feminina", comemora com uma promessa para quem ainda tem restrições ao seu
estilo: "Hoje até os roqueiros com uma pegada mais forte vão ouvir (o novo
álbum) e achar um discaço."
http://musica.uol.com.br/noticias/redacao/2013/04/23/com-novo-cd-guilherme-arantes-diz-que-brasil-vive-monocultura-e-so-sertanejo-pagode.htm
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