domingo, 24 de agosto de 2014

Vamos em frente...










Só rindo...























Refletindo...


“Aquele que não sabe e não sabe que não sabe. Ele é tolo. Evite-o.

Aquele que sabe e não sabe que sabe. Ele está adormecido. Desperte-o.

Aquele que não sabe e sabe que não sabe. Ele é humilde. Ensine-o.

Aquele que sabe e sabe que sabe. Ele é sábio. Siga-o.”

Provérbio Chinês

Língua afiada...



PEGADINHA GRAMATICAL
Colocação Pronominal

Sobre os pronomes:

O pronome pessoal é do caso reto quando tem função de sujeito na frase. O pronome pessoal é do caso oblíquo quando desempenha função de complemento. Vamos entender, primeiramente, como o pronome pessoal surge na frase e que função exerce. Observe as orações:

1. Eu não sei essa matéria, mas ele irá me ajudar.
2. Maria foi embora para casa, pois não sabia se devia ajudá-lo.

Na primeira oração os pronomes pessoais “eu” e “ele” exercem função de sujeito, logo, são pertencentes ao caso reto. Já na segunda oração, observamos o pronome “lhe” exercendo função de complemento, e consequentemente é do caso oblíquo.

Os pronomes pessoais indicam as pessoas do discurso, o pronome oblíquo “lhe”, da segunda oração, aponta para a segunda pessoa do singular (tu/você): Maria não sabia se devia ajudar.... Ajudar quem? Você (lhe).

Importante: Em observação à segunda oração, o emprego do pronome oblíquo "lhe" é justificado antes do verbo intransitivo "ajudar" porque o pronome oblíquo pode estar antes, depois ou entre locução verbal, caso o verbo principal (no caso "ajudar ") estiver no infinitivo ou gerúndio.

Exemplo: Eu desejo lhe perguntar algo.  
Eu estou perguntando-lhe algo.

Os pronomes pessoais oblíquos podem ser átonos ou tônicos: os primeiros não são precedidos de preposição, diferentemente dos segundos que são sempre precedidos de preposição.

Pronome oblíquo átono: Joana me perguntou o que eu estava fazendo.
Pronome oblíquo tônico: Joana perguntou para mim o que eu estava fazendo.

Colocação pronominal

De acordo com as autoras Rose Jordão e Clenir Bellezi, a colocação pronominal é a posição que os pronomes pessoais oblíquos átonos ocupam na frase em relação ao verbo a que se referem.

São pronomes oblíquos átonos: me, te, se, o, os, a, as, lhe, lhes, nos e vos.

O pronome oblíquo átono pode assumir três posições na oração em relação ao verbo:

1. próclise: pronome antes do verbo
2. ênclise: pronome depois do verbo
3. mesóclise: pronome no meio do verbo

Próclise

A próclise é aplicada antes do verbo quando temos:

• Palavras com sentido negativo:

Nada me faz querer sair dessa cama.
Não se trata de nenhuma novidade. 

• Advérbios:

Nesta casa se fala alemão.
Naquele dia me falaram que a professora não veio.


• Pronomes relativos:

A aluna que me mostrou a tarefa não veio hoje.
Não vou deixar de estudar os conteúdos que me falaram.

• Pronomes indefinidos:

Quem me disse isso?
Todos se comoveram durante o discurso de despedida.

• Pronomes demonstrativos:

Isso me deixa muito feliz!
Aquilo me incentivou a mudar de atitude!

• Preposição seguida de gerúndio:

Em se tratando de qualidade, o Brasil Escola é o site mais indicado à pesquisa escolar.

• Conjunção subordinativa:

Vamos estabelecer critérios, conforme lhe avisaram.

Ênclise

A ênclise é empregada depois do verbo. A norma culta não aceita orações iniciadas com pronomes oblíquos átonos. A ênclise vai acontecer quando:

• O verbo estiver no imperativo afirmativo:

Amem-se uns aos outros.
Sigam-me e não terão derrotas.

• O verbo iniciar a oração:

Diga-lhe que está tudo bem.
Chamaram-me para ser sócio.

• O verbo estiver no infinitivo impessoal regido da preposição "a":


Naquele instante os dois passaram a odiar-se.
Passaram a cumprimentar-se mutuamente.

• O verbo estiver no gerúndio:

Não quis saber o que aconteceu, fazendo-se de despreocupada.
Despediu-se, beijando-me a face.

• Houver vírgula ou pausa antes do verbo:

Se passar no vestibular em outra cidade, mudo-me no mesmo instante.
Se não tiver outro jeito, alisto-me nas forças armadas.

Mesóclise

A mesóclise acontece quando o verbo está flexionado no futuro do presente ou no futuro do pretérito:

A prova realizar-se-á neste domingo pela manhã.
Far-lhe-ei uma proposta irrecusável.


Interessante...




Conheça 5 curiosidades sobre a chuva

Dias de sol são os preferidos de muita gente, mas temos de admitir que um dia de chuva de vez em quando é muito gostoso, principalmente quando estamos em casa acompanhados de um bom filminho e uma xícara de café.

Ela que pode ser desejada por muitos em regiões secas e não muito querida por lugares que enfrentam enchentes (ou são muito úmidos o ano inteiro), tem várias facetas e curiosidades muito interessantes. Confira abaixo algumas delas:

1 – A velocidade
 
  
As nuvens de chuva são geralmente formadas a uma altitude de 1000 a 1200 metros acima do solo. Se um objeto com o mesmo peso e tamanho de uma gota de chuva cair desta altura, ele atingiria uma velocidade de queda livre, chegando à superfície a cerca de 558 km/h, o que provavelmente causaria um grande estrago.

Mas porque as gotas de chuva não machucam as pessoas ou não estragam o local aonde caem? Devido à forma oval de suas gotículas, a força de atrito é aumentada na atmosfera, impedindo que elas ultrapassem uma velocidade limite. Por isso, a velocidade com que elas chegam à superfície não passa de 8 a 10 km/h, não importando de que altura ela caia. 

2 – Circulação de 16 milhões de toneladas de água

 

A magnitude do ciclo da água é deslumbrante. Quando milhões de partículas de vapor se unem, elas formam gotículas de umidade. À medida que estas aumentam de tamanho, finalmente tornam-se fortes o suficiente para cair na superfície em forma de precipitação, variando entre chuva, neve, granizo e orvalho.

Estima-se que 16 milhões de toneladas de água, em qualquer uma dessas formas acima, caiam em direção à Terra a cada segundo. Através do processo de evaporação toda essa umidade é puxada de volta para a atmosfera e assim o ciclo continua incessantemente. Com isso, em um dia, a Terra recebe cerca de 306 bilhões de galões de água.

3 – “Chuva de sangue”

 

A “chuva de sangue” ou “chuva vermelha” é um fenômeno que acontece em algumas poucas ocasiões, mas que já foi registrada desde os tempos antigos. Por exemplo, Plutarco falou sobre uma chuva sangrenta que caiu após as grandes batalhas com as tribos dos homens de Criso (que ele refere como “germanos”).

Plutarco acreditava que a evaporação do sangue no campo de batalha ficava impregnada no ar, “pintando” as gotas de água comuns na cor vermelho-sangue.

O último registro da famosa chuva vermelha foi na Índia, no estado de Kerala, em 2001. O evento foi especialmente impressionante pelo tempo de duração, caindo na região durante cerca de dois meses. Uma das suposições é a presença de poeira vermelha nas nuvens, que pode ter sido suspensa a partir do deserto do Saara, porém, pela duração do fenômeno na Índia, dispensaram essa hipótese.

Uma versão considerada um pouco controversa do físico indiano Godfrey Louis supõe que as partículas vermelhas na chuva estejam relacionadas com alienígenas e uma explosão de um meteoro na atmosfera superior sobre o estado de Kerala em 25 de julho de 2001, pouco antes da primeira chuva de sangue. Godfrey analisou amostras da água da chuva e verificou que elas continham células do tipo das hemácias, mas sem DNA, revelando que elas teriam uma forma de vida, mas não sabe de onde vieram. 

No entanto, tempos depois a teoria de Godfrey foi desbancada, pois as partículas que causaram a cor vermelha da chuva em Kerala eram "morfologicamente semelhantes" a algas e esporos de fungos do tipo Trentepohlia.

Mas não é só o vermelho que pode colorir uma chuva. Já foram registradas chuvas negras (devido às cinzas vulcânicas), brancas ou leitosas (devido à suspensão de calcário branco: giz) ou até amarelas ou verdes, devido a um excesso de pólen no ar.

4 – Chuva de peixes
 


Pode parecer coisa de filme, mas você sabia que já foram relatadas ao longo da história “chuva de animais”, como peixes e sapos? Uma hipótese para explicar esse fenômeno é que os ventos fortes ou tornados que viajam sobre as águas às vezes capturam criaturas como peixes ou rãs e as carregam por vários quilômetros.

Segundo relatos, às vezes, os animais sobrevivem à queda, sugerindo que eles são descartados logo após a “captura” dos ventos. Várias testemunhas de “chuvas de sapos” descrevem os animais como assustados, apesar de saudáveis, apresentando um comportamento relativamente normal logo após o evento.

Mais recentemente, uma explicação científica para o fenômeno também tem sido relacionada às chamadas trombas d’água. No entanto, esses fenômenos são muito limitados em se tratando da capacidade de levantar objetos no ar, conseguindo apenas esse feito com gotas de água e detritos da superfície (como terra e folhas) que são rapidamente descartados ao longo de trajetórias balísticas.

No distrito de Yoro, em Honduras, a chuva de peixes atinge a região em uma época de fartura de pesca, entre os meses de maio e julho. Durante esse período, muitos vendavais e tempestades fortes, que podem durar horas, acontecem. Quando algumas dessas chuvas acabam, muitos peixes são vivos são encontrados no chão e os moradores pegam para cozinhar.

Este é um fenômeno único, que acontece todos os anos no mesmo local, mas os cientistas ainda não conseguiram encontrar uma explicação. Alguns argumentam que a principal razão são os furacões frequentes, que levantam os peixes do Oceano Atlântico e os levam para a terra mais próxima. Porém, em geral, o mistério das chuvas de peixes e sapos ainda não foi solucionado claramente.

5 – O cheiro de chuva



A maioria das pessoas percebe um cheiro característico no ar depois de chover. Um dos mais agradáveis aromas de chuva, aquele que frequentemente notamos no campo, é realmente causado por bactérias. Elas são do tipo Actinomicetos, filamentosas, que crescem no solo quando as condições climáticas estão úmidas e quentes.

Quando o solo seca, a bactéria produz esporos. Com a força e a água, a chuva solta estes minúsculos esporos no ar, onde a umidade age como um “spray”, carregando essas partículas e as espalhando no ar.  Estes esporos liberam vapores de óleos com um cheiro de terra distinto, por isso, é associado com a precipitação.

A bactéria é extremamente comum e pode ser encontrada em áreas em todo o mundo, representando a universalidade deste delicado cheiro de chuva. O cheiro fica ainda mais forte quando a chuva vem depois de um longo período de seca.

Outro tipo de odor é causado pela acidez da chuva. Devido às substâncias químicas na atmosfera, a água da chuva tende a ser um pouco ácida, especialmente em ambientes urbanos. Quando ela entra em contato com resíduos orgânicos ou produtos químicos no solo, pode causar algumas reações particularmente aromáticas.

Outro cheiro pós-chuva vem de óleos voláteis que as plantas e as árvores liberam e que podem se fixar também em rochas. A chuva reage com o óleo e o carrega como um gás através do ar. Este perfume é como os esporos das bactérias, que a maioria das pessoas considera como um odor agradável e fresco.


História...



Igreja e ditadura: Como os religiosos se tornaram o maior inimigo dos militares

Saudada pela Igreja, a ditadura tomou o poder no Brasil. Mas bispos e frades ajudaram a sociedade civil a reencontrar o caminho da democracia

O golpe que lançou o Brasil em 21 anos de regime militar em 1964 encheu de euforia o coração de um presbítero de Petrópolis (RJ). Reconhecendo na “revolução” a chance de um novo país, livre do comunismo ateu que ameaçava a cristandade, o padre deslocou-se até o Rio de Janeiro com um só objetivo: dar a bênção às tropas do general Olímpio Mourão Filho, que tinham vindo desde a mineira Juiz de Fora para ocupar a Guanabara.

Dois anos depois, esse religioso, chamado Paulo Evaristo Arns, foi ordenado bispo; em 1970, assumiu como arcebispo de São Paulo. Desde então, o outrora entusiasta da ascensão dos militares assumiu posição decisiva na contestação e denúncia dos crimes da ditadura. 

Lutou contra a tortura, liderou o histórico ato na Catedral da Sé em memória do jornalista Vladimir Herzog, criou a Comissão Justiça e Paz e abraçou o projeto Brasil: Nunca Mais, que evitou o sumiço de milhares de documentos fundamentais para contar a história daqueles dias. Hoje é considerado, com justiça, um herói da resistência aos generais – um contraste e tanto com o apoio prestado ao então recém-nascido regime.

 

As posturas de dom Paulo são representativas da trajetória da Igreja Católica durante a ditadura no Brasil. Um caminho acidentado no qual, após a euforia pela queda de João Goulart, posições conservadoras e atos de reação conviveram durante muito tempo, até que a ilusão de um governo redentor desabasse e a redemocratização se tornasse inevitável. 

Em um país de forte base católica, os movimentos da Igreja desenham a própria postura da sociedade civil diante do estado de exceção que a muitos pareceu promissor, mas que com o tempo se revelou intolerável.

O apoio

“Em maio de 1964”, diz o historiador Paulo César Gomes Bezerra, “um manifesto assinado por 26 bispos da CNBB agradecia aos militares por ‘salvarem’ o país do perigo iminente do comunismo”. Bezerra é autor de Os Bispos Católicos e a Ditadura Militar Brasileira: a Visão da Espionagem, que será publicado em 2014 pela Editora Record para marcar os 50 anos do evento. 

A declaração dos bispos manifestava gratidão aos novos governantes por terem “acudido a tempo” e impedido a consumação de um “regime bolchevista” no Brasil. “Ao rendermos graças a Deus”, dizia o documento, “agradecemos aos militares que, com grave risco de suas vidas, se levantaram em nome dos supremos interesses da nação.”

As palavras refletem um sentimento que animou boa parte das ações da Igreja naqueles dias: o temor diante do comunismo, destruidor da família, que vinha para esmagar os preceitos cristãos. Mas demonstra também uma proximidade com o poder, o que, no caso brasileiro, não era novidade. 

No país, até o final do século 19, a Igreja nem sequer existia como entidade autônoma. No sistema do padroado, eram os governantes que nomeavam bispos e padres, além de financiarem e administrarem grande parte da estrutura eclesiástica. Mesmo com a República e a institucionalização do Estado laico, a ligação estreita se manteve – e os dirigentes entendiam bem a importância do apoio religioso às suas decisões.

A Marcha da Família com Deus pela Liberdade, decisiva como suporte ideológico e popular ao movimento militar, evidenciava tais laços, uma vez que a Igreja atuou fortemente na organização das manifestações. Em São Paulo, Leonor Mendes de Barros, esposa do governador Ademar de Barros, ao fim da marcha, assistiu à missa do padre irlandês Patrick Peyton, que estava no Brasil a convite do cardeal Jaime de Barros Câmara, da Arquidiocese do Rio.

Manifestações semelhantes ocorreram no Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Curitiba. O padre Antônio Abreu, ligado há mais de 40 anos ao Instituto Brasileiro de Desenvolvimento (Ibrades), organismo vinculado à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), descreve outros aspectos que influenciaram a posição da instituição. 

Segundo ele, além de proteger a Igreja e a cristandade, havia entre alguns simpatia por um nacionalismo popular de base militar, a exemplo do que Gamal Abdel Nasser promovia no Egito. “No momento do golpe, a identificação da Igreja era com as elites em geral, em uma postura política antiliberal e antidemocrática”, afirma Abreu. 

“Entre os que realmente queriam políticas públicas de caráter social, parcela razoável acreditava ser mais provável os militares realizarem aquilo que na democracia não era viável. Julgavam ditaduras esclarecidas mais eficazes para o bem público.”

Fundada em 1952, a CNBB elegeu em 1964 uma direção conservadora. A presidência ficou com dom Agnelo Rossi, que logo em seguida seria nomeado pelo papa Paulo VI arcebispo de São Paulo. O então secretário-geral da entidade, dom Hélder Câmara, opositor de primeira hora do regime, foi deslocado do Rio de Janeiro para a arquidiocese de Olinda e Recife, sendo substituído por dom José Gonçalves, mais simpático aos novos tempos. Com uma elite católica pronta a dar seu aval, os militares estavam legitimados para agir.

Apesar do conservadorismo da cúpula, vivia-se um período de renovação na Igreja Católica. Entre 1962 e 1965, ocorreu o Concílio Vaticano II, uma das mais amplas reformas da história do catolicismo. A partir dele, a Igreja tentou transformar sua relação com a sociedade, colocando em primeiro plano a justiça social, a defesa dos direitos humanos e o auxílio aos necessitados de todos os tipos. 

Era momento de repensar a relação da fé católica com o ambiente político e social que a cercava – um sopro de mudança que demorou um pouco a arejar o alto comando da Igreja brasileira, ainda que tenha sido percebido em outros lugares.


A contestação

O apoio da Igreja Católica ao golpe pode ter sido majoritário, mas não foi unânime. O bispo de Volta Redonda, dom Waldyr Calheiros, foi quase um pioneiro: já na noite do 31 de março de 1964 leu um sermão cheio de comentários desabonadores à derrubada de Jango. Sem contar a oposição férrea de dom Hélder Câmara – um homem tão combativo que logo passou a ser monitorado de perto pelos militares. 

Pelo menos desde 1966, o Centro de Informações da Polícia Federal abastecia um dossiê sobre o bispo, e a divisão de segurança e informações do Itamaraty fazia de tudo para impedir suas viagens ao exterior – nas quais ele invariavelmente denunciava a violência da ditadura brasileira. A partir de 1970, a imprensa não podia nem ao menos citar o nome de dom Hélder, para o bem ou para o mal; era como se o religioso, mesmo vivo e atuante, não existisse.

Os mandatários religiosos seguiam alinhados aos militares, mas outras esferas adotavam uma postura crescente de resistência e contestação. “A Igreja, em todos os tempos e lugares, sempre refletiu a luta de classes, como todas as instituições”, afirma Frei Betto, dominicano famoso pela atuação em movimentos pastorais e sociais. 

Ele tomou parte direta na mais explícita atuação de setores da Igreja junto à guerrilha: o alinhamento com a Aliança Libertadora Nacional, de Carlos Marighella.

Enquanto os dominicanos como Frei Betto auxiliavam pessoas a fugir do Brasil, o arcebispo do Rio de Janeiro, dom Eugênio Sales, oferecia ajuda a indivíduos perseguidos por outras ditaduras da América do Sul. Iniciado em 1976, o processo ganhou tal volume que, a partir de 1979, o bispo chegou a hospedá-los em sua própria residência, na Rua da Glória.

Ao todo, com o apoio da Cáritas brasileira e do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (Acnur), dom Eugênio teria socorrido, até 1982, mais de 4 mil pessoas. Alguns chegavam por iniciativa do então padre da Companhia de Jesus argentina Jorge Mario Bergoglio, hoje papa Francisco. Tanto dom Eugênio quanto dom Paulo Evaristo Arns teriam recebido pessoas enviadas por Bergoglio ao Brasil – uma das muitas histórias que evidenciam a colaboração entre religiosos no continente.

 

A ditadura não estava alheia a esses movimentos e começou a agir de forma cada vez mais dura. Em 1966 o padre Henrique Pereira Neto, auxiliar de dom Hélder Câmara, foi assassinado pelo Comando de Caça aos Comunistas (CCC), um grupo paramilitar. A partir daí, o porão do regime perdeu o constrangimento e se voltou contra a Igreja. 

A reação dos órgãos eclesiásticos, em princípio, foi tímida: apenas em maio de 1970 viria o primeiro documento da CNBB denunciando a prática de tortura no país, ainda assim com o cuidado de criticar também ações atribuídas à esquerda, como assaltos e sequestros. 

Em outubro daquele ano, porém, a prisão do secretário-geral da CNBB, dom Aloísio Lorscheider, durante uma ação do Departamento de Ordem Pública e Social (Dops) na sede do Ibrades, azedou totalmente o diálogo. Foi a primeira vez que um alto dirigente da CNBB viu-se nas mãos dos militares.

Lorscheider ficou preso durante cerca de quatro horas. Tempo suficiente para o alto clero atacar o regime com ousadia inédita. Os cardeais chegaram a enviar carta diretamente ao então presidente, o general Emílio Garrastazu Médici, lamentando a “deterioração” de seus vínculos. 

O impacto internacional também foi péssimo: a imprensa do Vaticano noticiou o fato e até o papa Paulo VI manifestou publicamente apoio aos bispos brasileiros. “Foi quando se resolveu criar a Comissão Bipartite, que funcionou entre 1970 e 1974, com o intuito de promover diálogos entre a Igreja e o Estado e evitar a ruptura”, afirma o historiador Paulo César Gomes Bezerra. O efeito da medida, contudo, foi limitado: as relações entre as instituições jamais voltariam a ser as mesmas.

Dominicanos no cárcere

Nenhum setor da Igreja brasileira foi tão fundo na oposição ao regime quanto os dominicanos. Os frades passaram a apoiar perseguidos políticos que precisavam esconder-se ou fugir do país. Foi essa ação que os aproximou de Carlos Marighella e da Aliança Libertadora Nacional. Em 1968, com o advento do AI-5, a repressão chegou ao momento mais duro – e Frei Betto, morando no Rio Grande do Sul, ajudou dezenas de pessoas a atravessar a fronteira do Uruguai.

A ligação dos dominicanos com questões sociais e políticas vem desde os anos 1940, a partir da Ação Católica (AC), movimento que buscava maior inserção da Igreja junto aos movimentos da sociedade civil. Como forma de recrutar estudantes, surgiram dentro da AC grupos como a Juventude Estudantil Católica (JEC) e a Juventude Universitária Católica (JUC). 

A partir deles, nasceu a Ação Popular (AP), segundo Frei Betto “um movimento de esquerda, laico, independente da Igreja”, com forte presença dos dominicanos e forte inserção no meio universitário. Depois do golpe, a organização passou à clandestinidade.

Com o endurecimento do regime, os serviços de inteligência passaram a prestar especial atenção nos dominicanos, levando a uma série de prisões, como a dos frades Fernando, Ivo e Tito, todos alvo de torturas e expostos como terroristas. 

O caso de frei Tito tornou-se tristemente célebre: incapaz de conciliar-se com as memórias dos padecimentos, ele se suicidou nos arredores de um convento francês em 1974, aos 28 anos. No exílio ou na cadeia, os dominicanos continuavam incomodando o poder.

“Nós, religiosos presos, éramos a principal fonte de denúncia no exterior dos crimes praticados pela ditadura. E o papa Paulo VI nos deu ouvidos e apoio”, diz Frei Betto. “Na tentativa de nos neutralizar, nos obrigaram a partilhar do mesmo regime carcerário dos presos comuns. Nem assim cessamos as denúncias, pois as informações sempre nos chegavam.” A voz dos dominicanos ecoou em todo o mundo e levou a uma rejeição cada vez maior à ditadura no exterior.

A denúncia

Em 1970, a mudança de comando na Arquidiocese de São Paulo aumentou o fosso entre Igreja e militares. Frei Betto afirma que, mesmo após visitar dominicanos no Dops e ouvir seus relatos, o então arcebispo, dom Agnelo Rossi, seguia negando que houvesse tortura nas prisões. O Vaticano, então, resolveu transferir dom Agnelo a Roma – uma espécie de promoção às avessas, já que abriu espaço para seu auxiliar, dom Paulo Evaristo Arns, assumir a arquidiocese.

A essa altura, a simpatia de dom Paulo pelo golpe já tinha virado fumaça. Ele se tornou firme opositor da ditadura no Brasil, tanto no discurso quanto na prática: fundou a Comissão Justiça e Paz, o grupo Clamor (uma rede de solidariedade a fugitivos das ditaduras sul-americanas) e o projeto Brasil: Nunca Mais, que reunia em segredo documentos relativos aos porões da ditadura militar. Além disso, promoveu a criação de várias pastorais (como a da Moradia, a da Criança e a Operária), de valioso papel na consolidação dos movimentos sociais na reta final do período dos militares no comando do país.

Durante os anos de chumbo, surgiram também as Comunidades Eclesiais de Base (CEBs). Incentivadas por seguidores da Teologia da Libertação, como Leonardo Boff e o próprio Frei Betto, as CEBs tentavam suprir a falta de sacerdotes nas áreas de baixa renda, em especial no Nordeste. “Por serem movimento de Igreja, a repressão não deu muita importância a elas, que se tornaram incubadoras de movimentos populares”, diz Frei Betto.

Em 1975, o caso do jornalista Vladimir Herzog, torturado até a morte no quartel-general do II Exército, em São Paulo (veja ao lado), abalou os alicerces do regime. A partir do episódio, ficou impossível negar o que acontecia nos porões. No ano seguinte, o metalúrgico Manuel Fiel Filho foi outra vítima fatal da tortura nas prisões do Doi-Codi. 

A repercussão do assassinato – mais um suicídio por enforcamento, na versão dos militares – foi tão expressiva que o general Ednardo d’Ávila Mello, advertido pelo presidente Ernesto Geisel no caso Herzog, foi exonerado do comando do II Exército. Para o jornalista Elio Gaspari, autor da maior obra sobre a ditadura militar brasileira, o enquadramento de Geisel aos militares do porão no episódio marcou o fim da bagunça na tropa.

A essa altura, a Igreja tinha assumido uma postura de clara oposição. No final dos anos 1970, as Forças Armadas tentaram sem sucesso deportar dom Pedro Casaldáliga, bispo de origem catalã que atuava na região de São Félix do Araguaia (MT). Próximo de dom Pedro, o padre João Bosco foi morto em 1976 com um tiro dentro de uma delegacia onde tinha ido denunciar abusos contra camponeses. 

A sequência da queda de braço com os religiosos incluiu investigação a outros bispos, como dom Fernando Gomes e dom Waldyr Calheiros, e o monitoramento de perto do jornal O São Paulo, da Arquidiocese da cidade – o último veículo brasileiro a livrar-se da censura prévia, já em 1978.

O ato ecumênico por Herzog na Sé

“A morte do Vlado evidenciou muitas ações dos bispos. Antes, o registro do que diziam ficava no canto de página dos jornais. Isso quando saía”, diz o jornalista Audálio Dantas, autor de As Duas Guerras de Vlado Herzog, livro-reportagem que recebeu o Prêmio Jabuti em 2013. 

A versão de suicídio apresentada pelos militares foi contestada não apenas pelos colegas do jornalista morto, mas também por líderes religiosos. Herzog era judeu. Segundo o rito judaico, os suicidas devem ser enterrados perto dos muros dos cemitérios. Mas ao ver o corpo, o rabino Henri Sobel tomou uma decisão que teve o peso de denúncia: ordenou que Herzog fosse enterrado na área comum do Cemitério Israelita do Butantã, em São Paulo, um claro desmentido à versão dos militares.

Foi o Sindicato dos Jornalistas de São Paulo, do qual Audálio fazia parte, que teve a ideia de um culto ecumênico em memória de Herzog. No dia 28 de outubro, mesma data em que dom Paulo concordou em ceder a Catedral da Sé para o ato, dom Eugênio Salles recusou no Rio de Janeiro pedido da Associação Brasileira de Imprensa (ABI) para uma missa com o mesmo objetivo. 

A recusa não era inexplicável: o clima era de tensão, com constantes ameaças. Pouco antes do ato na Sé, dom Paulo Evaristo Arns foi visitado por dois secretários do governador de São Paulo, Paulo Egydio Martins. Segundo os emissários, centenas de policiais tinham ordens de atirar ao menor sinal de confusão. Usando uma inauguração como pretexto, o presidente Geisel abalou-se de Brasília para a capital paulista para acompanhar os desdobramentos. “Só foi embora quando o culto terminou”, diz Audálio.

O culto ecumênico aconteceu no dia 31 de outubro de 1975, presidido por dom Paulo e com a presença do rabino Henri Sobel e do pastor protestante James Wright. Mesmo proibida qualquer menção a seu nome em veículos de imprensa, dom Hélder Câmara também compareceu, sem pronunciar palavra. Mais de 300 barreiras policiais impediam o acesso da população à catedral; ainda assim, 8 mil pessoas lotaram o lugar.

A memória

Da segunda metade dos anos 1970 em diante, a Igreja brasileira acertou o passo com a sociedade civil na caminhada de retorno à democracia. Entre 1976 e 1977, a CNBB lançou documentos denunciando de forma explícita casos como o que vitimou o padre João Bosco e o operário Fiel Filho. 

“A segurança, como bem da Nação, é incompatível com uma permanente insegurança do povo”, dizia uma dessas notas, condenando as “medidas arbitrárias”, os “desaparecimentos inexplicáveis” e “inquéritos aviltantes” promovidos pelos militares. Ainda assim, alguns bispos – entre eles dom Antônio Castro Mayer e dom Geraldo Sigaud – teriam, segundo o historiador Paulo César Bezerra, permanecido fiéis ao regime militar até o fim.

 

Com a consolidação da abertura política, a tensão entre religiosos e militares diminuiu. Entretanto, o lado da fé continuou somando vítimas, como o líder metalúrgico Santo Dias da Silva, militante da Pastoral Operária, morto pela Polícia Militar em outubro de 1979 enquanto participava de uma greve em São Paulo. A violência representou mais um abalo nas já frágeis estruturas do regime: o velório, novamente na Catedral da Sé, reuniu mais de 15 mil pessoas e o cenário forçou uma mudança de postura do governo com relação às entidades sindicais.

A CNBB assumiu no final da década papel ativo na campanha pela anistia e depois contribuiu na articulação do movimento Diretas Já. Além disso, seguiam os esforços para preservar a memória do período. A Editora Vozes, vinculada à Igreja Católica, editou o livro Brasil: Nunca Mais em 1985, meses depois da retomada da democracia. 

Se tinham sido fundamentais na sustentação do regime militar quando este se iniciou, no apagar das luzes da ditadura os religiosos abriam caminho para que não fossem esquecidos os duros anos de repressão.

O projeto Brasil: Nunca Mais resultou em cerca de 900 mil páginas, referentes a centenas de processos. O material foi microfilmado e enviado ao Conselho Mundial de Igrejas, em Genebra, na Suíça, para evitar que fosse apreendido e destruído pelos militares. Foram necessários 25 anos até que esse pedaço da história brasileira fosse repatriado. 

Em 2011, os microfilmes voltaram ao país, e em agosto de 2013 foi lançado o BNM Digital, site que disponibiliza a consulta a toda essa documentação.

Hoje, com a Comissão Nacional da Verdade e suas ramificações estaduais, o país busca iluminar os cantos escuros do período gerado pelo golpe e, a partir deles, enxergar melhor a si mesmo. A ditadura talvez não tivesse se consolidado sem a bênção inicial da Igreja Católica ao novo regime, mas as denúncias e a combatividade dos religiosos foram igualmente fundamentais na retomada da democracia.


Mais uma etapa superada...