quarta-feira, 8 de maio de 2013

Viva a sabedoria...


A relação de poder entre os povos indígenas segundo Pierre Clastres
Segundo Pierre Clastres, a relação de poder entre os povos indígenas difere da visão ocidental por não ser baseada na dicotomia comando-obediência.
Segundo Pierre Clastres o Ocidente classifica as sociedades indígenas como sociedades sem poder
O etnocentrismo constitui uma barreira epistemológica porque apenas conseguimos ver a outra cultura a partir de nossas próprias categorias. A etimologia da palavra, por si só, já constitui uma explicação: seria uma etnia no centro, ou seja, ver todas as outras culturas a partir daquilo que tomamos como central, importante e verdadeiro. Isso impossibilita uma verdadeira apreensão de outras sociedades.
Segundo Pierre Clastres, é isso que ocorre na questão do poder. O Ocidente classifica as sociedades indígenas como sociedades sem poder. Elas apresentam um chefe, mas este chefe é desprovido de poder coercitivo. Para o autor, o grande problema é que para pensar o poder nessas sociedades, a etnologia (estudo das etnias) parte sempre do poder político que se baseia na dicotomiacomando-obediência.
Para essas sociedades, nada seria mais estranho do que alguém mandar no outro e o outro obedecer. Elas não veem o poder a partir dessa categoria. A etnologia em seus estudos faz com que as sociedades primitivas girem em torno da civilização ocidental, como se o poder comando-obediência fosse a forma universal do poder. Para Clastres, universal é o fato de que não há social sem poder, pois essa é uma questão que teve de ser resolvida por todas as sociedades. Entretanto, a forma como cada uma enfrentou e resolveu seu próprio problema é uma forma particular de pensá-lo, assim como o poder que se apresentou no Ocidente é uma solução particular e que teve entre os selvagens uma solução diferente.
É nesse sentido que o autor fala de uma “revolução copernicana”, pois pensa ser necessário ver as sociedades indígenas a partir de si mesmas. A etnografia (registro das etnias) deve retirar o Ocidente do centro de suas indagações e ver a questão do poder através das soluções dos próprios indígenas. Da mesma forma que Copérnico retira a Terra do centro de seu sistema – assim operando uma verdadeira revolução na astronomia, o que possibilita todo o avanço da ciência – também a etnologia deve provocar esta revolução para, somente neste caso, tornar possível uma antropologia política.
É preciso ver essas sociedades através de sua positividade. Elas não chegaram até nossa forma de poder, não porque foram incompetentes; simplesmente negaram-se a ela, negaram-se a constituir um Estado como o modelo ocidental, que tem como base as categorias comando-obediência. O poder, como questão, foi resolvido de diferentes formas por diversas sociedades. São sociedades que não permitem uma divisibilidade, isto é, não criam divisões por idade, sexo, ou trabalho. Isto é algo que jamais será compreendido pelo Ocidente.
Clastres concorda com Lapierre que a inovação social produz o poder. Segundo este, o poder seria coercitivo, não um poder não coercitivo. Como a inovação é a produção de história, as sociedades sem poder coercitivo são sociedades sem história. Não estaria o autor sendo vítima do etnocentrismo? Ele questiona o poder comando-obediência para estudar nações sem esse poder coercitivo, mas quer tomar as categorias ocidentais para definir como se faz história.
Ao afirmar o poder político nessas sociedades, Clastres afirma a possibilidade da história. Para a existência do poder é necessária toda uma organização social a qual difere da organização social dos animais. Toda sociedade humana tem como pré-requisito conseguir educar as gerações futuras em sua cultura, para que possa manter a sua estrutura social. E isso representa a tradição, que é a primeira forma de produção histórica (compreender a sua própria sociedade a partir de suas próprias categorias) que foi elaborada no interior deste grupo e conseguir mantê-las é o que se chama cultura. E onde há cultura é porque há história.
O poder não coercitivo é realizado de forma que uma figura mítica represente o chefe nos rituais que servem para rememorar a organização social. Basta que seja uma figura, nem sempre a mesma, mas que apenas cumpra a função de líder. No entanto, ele não exerce poder nenhum sobre os membros da sociedade.

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