Por que as
bibliotecas estão ociosas?
Pensar nos fatores culturais, históricos e sociais que contribuem
para a ociosidade das bibliotecas.
Dados indicam que 75
% da população brasileira nunca pisou em uma biblioteca, fato ligado à visão
das pessoas sobre a prática da leitura.
Saber ler e escrever não é mais privilégio de poucos. Se outrora
isso era algo restrito às elites, hoje, apesar dos 14 milhões de analfabetos
ainda existentes como aponta o IBGE, o que se vê é um avanço no sentido da
universalização da alfabetização. Porém, mesmo com o progresso em relação ao
número de alfabetizados e com a ampliação de bibliotecas em todo o país, o
brasileiro pouco frequenta esse espaço dedicado à leitura.
Em um estudo realizado no primeiro semestre de 2012, pelo Instituto
Pró-Livro, intitulado “Retratos da Leitura no Brasil”, os dados revelados pela
pesquisa são alarmantes. Indica-se que 75 % da população brasileira nunca pisou
em uma biblioteca, fato que está diretamente ligado à visão predominante das
pessoas sobre a prática da leitura: algo maçante, chato, difícil, não visto
como uma prática prazerosa ou divertida. As explicações possíveis para tal
fenômeno perpassam questões históricas e culturais, o que reflete diretamente
no comportamento social.
Dentre os aspectos que contribuem para isso estão um sistema
escolar que, por tratar das disciplinas e dos conteúdos de maneira fragmentada,
forma alunos imaturos socialmente e politicamente, como aponta o sociólogo
Edgar Morin (2000). Os alunos acabam por criar uma relação com os livros que
não está pautada no prazer da leitura em si, mas sim pela obrigação do estudo e
da pesquisa sobre conteúdos diversos, os quais, não necessariamente, os alunos
conseguem relacionar com seu dia a dia enquanto indivíduos. Logo, a leitura perde
sua característica enquanto algo estimulante por ampliar o conhecimento, assim
como seu potencial enquanto uma prática prazerosa de entretenimento,
tornando-se uma ferramenta (árdua e penosa para muitos alunos) para incutir
teorias, teses, fórmulas, entre outras coisas, conforme pregam muitos padrões
tradicionais de pedagogia e ensino com uma formação conteudista. Assim, a
biblioteca é vista como um lugar de estudo e pesquisa em que a frequência se
daria de forma compulsória e não de forma espontânea como entre aqueles que
gostam desse ambiente.
Contudo, a ociosidade ou
esvaziamento das bibliotecas não se dá apenas pela falta de empatia construída
ao logo dos anos de estudo por conta desse aspecto pedagógico. Trata-se de uma
característica cultural da sociedade brasileira, sociedade na qual,
historicamente como já se afirmou, a leitura e acesso aos livros estavam
restritos a elites. Além disso, uma sociedade de natureza capitalista como a
que vivemos acaba por ter o trabalho como atividade central no cotidiano do
homem comum, relegando a vida intelectual para outro plano. Logo, as altas
jornadas entre trabalho e deslocamento para casa não apenas ocupam o tempo, mas
impelem os indivíduos a uma necessidade de outras tantas horas de descanso,
fato que configura uma realidade presente entre a classe trabalhadora.
Somado a isso, tem-se a armadilha da facilidade do acesso à
informação pela internet. Com seus conteúdos resumidos e outros tantos recursos
de áudio e vídeo, ela parece ser mais atrativa que o conhecimento que se pode
obter apenas por meio da leitura de livros. Dessa forma, o resultado é o não
gosto pela leitura, a preferência pela superficialidade dos conteúdos da rede
mundial de computadores e uma visão alienada da realidade na qual este mesmo
indivíduo se insere. Isso não faz das novas tecnologias ou da própria internet
inimigas da leitura e do conhecimento, muito pelo contrário, são excelentes
ferramentas. No entanto, é a existência de conteúdos superficiais, de fontes
não confiáveis que pode comprometer a busca pelo conhecimento. O hábito da
leitura requer um esforço cognitivo e de interpretação mais intenso do que
apenas assistir ou ouvir conteúdos.
Dessa forma, o que se pode inferir sobre o não uso das bibliotecas
é que uma série de fatores inter-relacionados contribui para que a grande
maioria da população não seja frequentadora desses espaços. Como se sabe, em sociedades onde a leitura (e
a educação de maneira geral) é valorizada, tem-se o predomínio de um senso
crítico mais aguçado, logo de uma sociedade civil mais engajada, mais
participativa. Afinal, como diz o ditado popular: “para bom entendedor, um
pingo é letra”.
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