quinta-feira, 31 de maio de 2012

Viva a sabedoria...


A TENTATIVA DE CÍLON

Qualquer que seja sua origem, o fato é que essa família pertencia ao grupo dos eupátridas, "nobres" que partilhavam as funções que garantiam a direção dos negócios da cidade, e cuja linha de frente era formada pelo arcontado. No relato que compõe a primeira parte da Constituição de Atenas, o autor, Aristóteles ou um de seus discípulos, conta que o arcontado derivara da divisão do poder real primitivo para se tornar uma magistratura, a princípio, vitalícia, depois, concedida por dez anos, tornando-se, finalmente, anual. Assim, a cada ano designavam-se três arcontes*: o rei, encarregado principalmente dos assuntos religiosos, o polemarco*, comandante supremo do exército, e o arconte epônimo, que dava seu nome ao ano e presidia o Conselho do Areópago*, formado de ex-arcontes. Aos três arcontes dos primeiros tempos acrescentaram-se, posteriormente, seis tesmotetas*, guardiões das thesmoi, as regras comuns.

Foi como arconte que o primeiro alcmeônida conhecido historicamente, Mégacles, veio a desempenhar um papel importante. O período de seu arcontado situa-se no último terço do século VII, sem que se possa precisar melhor (636/635; 632/631; 628/627; 624/623?). Como muitas cidades gregas, Atenas passava então por uma crise que se relacionava, pelo menos do que se depreende dos relatos posteriores, com o fenômeno do monopólio das melhores terras e, no caso de Atenas, o endividamento de uma parte do campesinato. Como aconteceu em determinadas cidades, aqueles que buscavam tomar o poder procuraram tirar vantagem dessa crise. Daí o desenvolvimento da tirania no curso do século VI.3 Mencionou-se a dos Ortagóridas de Sicione. Poder-se-iam citar também os Cipsélidas de Corinto ou ainda um certo Teágenes de Mégara. Foi justamente com o apoio desse Teágenes, de quem era genro, que Cílon, que fora o vencedor em Olímpia e gozava de grande prestígio em função dessa vitória, tentou assenhorear-se de Atenas, apoderando-se da Acrópole. Heródoto (V, 71) fala somente de tentativa, mas o relato de Tucídides, muito mais completo, dá a entender que Cílon não apenas se apoderou da Acrópole, mas também resistiu a um longo cerco. Os atenienses, convocados pelo arconte, vieram em massa dos campos para tentar desalojá-los, ele e seus sequazes.

Com o passar do tempo, os atenienses ficaram cansados do sítio e muitos deles foram embora, passando a guarda aos nove arcontes, aos quais deram também plenos poderes para resolver o caso como melhor lhes parecesse [naquele tempo, com efeito, os nove arcontes tinham em suas mãos a maior parte da administração pública]. Cílon e seus homens, sitiados como estavam, encontravam-se numa situação difícil, porque lhes faltavam água e víveres. Cílon e seu irmão conseguiram escapar. Os outros, porém, desesperados, alguns até morrendo de fome, instalaram-se como suplicantes no altar da Acrópole. Os atenienses encarregados da guarda do templo, vendo que eles morriam no santuário, obrigaram-nos a sair: tiraram-nos de lá com a promessa de não lhes fazer mal, depois os mataram; no trajeto, houve alguns que se puseram ao lado das Deusas Veneráveis e foram executados. Por aquele ato, tanto os encarregados da guarda quanto os seus descendentes foram declarados malditos e pecadores contra a deusa (I, 126, 8-11).

O relato de Tucídides, da mesma forma que o de Heródoto, não faz referência nominal aos Alcmeônidas. Mas tanto um quanto outro, considerados em seu contexto, não deixam margem a nenhuma dúvida. Heródoto situa o seu logo depois de expor as reformas de Clístenes e a petição, formulada pelo rei espartano Cleômenes, chamado por Iságoras, para que os "impuros" fossem expulsos de Atenas (V, 70). Quanto a Tucídides, ele explica, no relato da tentativa de Cílon, a exigência dos lacedemônios, às vésperas da eclosão da guerra do Peloponeso, de que os atenienses "afastem a desonra cometida contra a Deusa", aqueles lacedemônios que "sabiam que Péricles, filho de Xantipo, estava implicado na maldição pelo lado materno" (I, 127, 1). Somente Plutarco, em sua Vida de Sólon (XII, 1), cita o arconte Mégacles como sendo, junto com os outros arcontes, responsável pelo sacrilégio cometido contra os sequazes de Cílon. Mas, nessa mesma Vida de Sólon (XII, 1), Plutarco, baseando-se nos arquivos do santuário de Delfos, lembra que o estratego que comandava o contingente ateniense quando da primeira guerra sagrada era Alcmêon. A primeira guerra sagrada para defender o santuário de Delfos teria ocorrido no começo do século VI, e esse Alcmêon seria o filho de Mégacles. O que nos permite supor que o exílio dos "sacrílegos" foi relativamente breve. No entanto, esse mesmo Alcmêon também iria inaugurar uma política de aliança com Delfos, que não deixaria de ter consequências para os Alcmeônidas.

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