sexta-feira, 4 de maio de 2012

Viva a sabedoria


Tratado da Correção do Intelecto, de Spinoza.
Onde existe o maior engano é quando acontece que algumas coisas que se oferecem
na imaginação estejam também no intelecto, isto é, sejam concebidas clara e distintamente; então, enquanto não se separa do confuso o distinto, a certeza, ou seja, a ideia verdadeira se mistura com as não distintas. Por exemplo, alguns estoicos por acaso ouviram o nome da alma e também que é imortal, as quais coisas imaginavam apenas confusamente; imaginavam também e ao mesmo tempo imaginavam que os corpos sutilíssimos penetravam todos os mais e por nenhum outro eram penetrados. Como imaginassem tudo isso junto, acompanhado da
certeza deste axioma, logo se convenciam de que a mente é esses corpos sutilíssimos e aqueles corpos sutilíssimos não se dividem, etc. Também disso, porém, nos livramos, enquanto nos esforçamos por examinar todas as nossas percepções conforme a norma de uma existente ideia verdadeira, precavendo? Nós, como dissemos no começo, do que temos pelo ouvido ou pela experiência vaga. Acresce que tal engano provém de que concebem as coisas de um modo excessivamente abstrato, pois é bastante claro por si que aquilo que concebo em
seu verdadeiro objeto não posso aplicar a outra coisa. Nasce, por último, também de que não imaginavam os primeiros elementos de toda a Natureza; donde, procedendo sem ordem e confundindo a Natureza com as coisas abstratas, embora sejam verdadeiros axiomas, a si mesmos se confundem e pervertem a ordem da Natureza. Nós, contudo, se procedermos ao menos abstratamente possível e começarmos, logo que possamos, pelos primeiros elementos, isto é, pela fonte e origem da Natureza, de nenhum modo devemos temer esse engano.



Trecho de O Olho e o Espírito, de Merleau-Ponty
Entretanto, Descartes não seria Descartes se houvesse pensado eliminar o enigma da visão. Não há visão sem pensamentos. Mas não basta pensar em ver: a visão é um pensamento condicionado; nasce por ocasião daquilo que sucede no corpo, é excitada a pensar por ele. Não escolhe nem ser ou não ser, nem pensar isto ou aquilo. Deve trazer em seu coração esse peso, essa dependência que não podem advir-lhe por uma intromissão de fora. Tais acontecimentos do corpo são instituídos pela natureza para nos darem a ver isto ou aquilo. O pensamento da visão funciona segundo um programa e uma lei que ele não se deu; não está de posse de suas próprias premissas; não é pensamento todo presente, todo atual, todo atual; há em seu centro um mistério de passividade. É, portanto, esta a situação: tudo o que se diz e se pensa da visão faz dela um pensamento. Quando, por exemplo se quer compreender como é que vemos a situação dos objetos, não há outro recurso senão supor a alma, que sabe onde estão as partes de seu corpo capaz de "transferir daí sua atenção" a todos os pontos do espaço que estão no prolongamento dos membros.

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