‘Não alimente os
mendigos’
Atolada
em uma crise política e administrativa que levou à cassação de dois prefeitos,
Campinas precisa avançar. E decidiu tirar os mendigos do caminho, prova de que
a maior cidade do interior paulista continua sem rumo. Às vésperas de ser
eleito indiretamente pelos vereadores como titular da prefeitura, no último dia
10, o ex-presidente da Câmara Municipal Pedro Serafim (PDT) agilizou a
aprovação de projetos de lei propostos por colegas. Entre eles, estão duas leis
antiesmola que dificilmente seriam sancionadas em situações de normalidade
política.
A primeira
permite a colocação de placas em vias públicas para alertar a população a não
dar esmolas. Detalhe: as placas poderão ser bancadas pela iniciativa privada,
em troca de publicidade. Quais seriam os dizeres? Não alimente os mendigos?
A segunda lei
vai além. Sob o argumento de que obstruem o trânsito, torna ilegais mendigos,
vendedores ambulantes, malabaristas e sujeitos que insistem em limpar o
parabrisa de carros à espera do sinal verde. O novo prefeito, que cumpre um
mandato tampão com a promessa de um "modelo empresarial", excluiu das
atividades que atrapalhariam o trânsito a distribuição de folhetos de
propaganda, talvez o único item que realmente merecesse apreciação no projeto
de lei apresentado pelo vereador Petterson Prado (PMDB), que desde 2005 via a
iniciativa ser rejeitada pela Câmara. O artigo foi rejeitado porque os folhetos
são fonte de receita para a Prefeitura, com a cobrança de taxas para a
liberação do serviço, e movimentam o próspero setor imobiliário da região.
O pacote
antiesmola também clama por segurança, obviamente. Coautor da
"socioeducativa" lei da plaquinha, o vereador Sérgio Benassi (PCdoB)
explica: "Em Campinas já se demonstrou uma associação muito grande entre a
mendicância, o tráfico de crack e os roubos e pequenos furtos que acontecem
para abastecer essa cadeia de consumo." Para o colega
Petterson, "o que nós temos aqui é um caso de crime travestido de
mendicância." Por isso, seu projeto prevê que a repressão da
mendicância caberá à Guarda Municipal, à Polícia Militar e à Polícia Civil. O
recado é claro: vaza, galera.
A validade da lei é questionável. Não só vai contra o
princípio constitucional de liberdade de ir e vir como também atropela o ECA
(Estatuto da Criança e do Adolescente), abrindo brecha para considerar
infratoras vítimas do trabalho infantil. A "lei da esmola" é uma encenação
de ordem pública em mais um caso de demofobia e criminalização da pobreza, raiz do caso
Pinheirinho. Mostra apenas o quanto Campinas precisa de um modelo
público — e não empresarial — de gestão.
http://br.noticias.yahoo.com/blogs/michel-blanco/n%C3%A3o-alimente-os-mendigos-221348670.html
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