Brasil soma
85 mil doentes sem radioterapia
Inca diz que faltam 155 aparelhos no
Brasil. Para os que conseguem tratamento, espera é de 113 dias
Radioterapia: déficit de 155
aparelhos em todo o País
Até o final do ano, o Brasil vai acumular 85 mil
pacientes com o diagnóstico de câncer, mas sem acesso ao tratamento fundamental para
mudar o curso da doença. A radioterapia – indicada principalmente para tratar
os tumores malignos de mama, próstata, garganta
e pele (todos
líderes em incidência no País) – não contempla todos os doentes brasileiros,
mostra mapeamento feito pela Sociedade Brasileira de Radioterapia (SBR).
Os números – já conhecidos pelo Instituto Nacional
do Câncer (Inca) e pelo Ministério da Saúde – foram feitos com o cruzamento de
três levantamentos feitos pelo Inca. O primeiro projeta os novos casos de
câncer que serão acumulados no ano de 2012 (520 mil, uma média de 12 por hora).
O segundo, é o número de máquinas atualmente em funcionamento (230 aparelhos).
E o terceiro que contabiliza a capacidade de tratamentos desta rede de
oncologia radioterápica, que não dá conta dos 320 mil doentes que precisam
exclusivamente da radioterapia para combater suas doenças.
Ainda nas contas do Inca, para atender as
recomendações da Organização Mundial de Saúde (OMS), seriam necessários mais
155 aparelhos de radioterapia. “O panorama que temos é horroroso”, sentencia
Carlos Manoel Mendonça de Araújo, diretor de radioterapia do Inca. “São quase
90 mil brasileiros que não estão nem na fila de espera, com a esperança de
serem atendidos. Esta estatística é sobre o número de pessoas que simplesmente
não serão atendidas.”
Quando os algarismos pontuam o intervalo entre o
diagnóstico do câncer e o acesso ao tratamento, o cenário também é ruim. Em
geral, a demora é de 113 dias, de acordo com um relatório feito pelo Tribunal
de Contas da União (TCU) no ano passado. Os especialistas sabem que este prazo
tende a ser ainda maior em Estados em que não há um único aparelho de
radioterapia, como Amapá e Roraima.
“Como se não bastasse ter de lidar com o déficit de
maquinário e a ausência de perspectiva de ter acesso ao tratamento perto de
casa, alguns doentes viajam quilômetros para fazer radioterapia – já
debilitados – e ainda esperam meses nas filas já grandes dos hospitais de
câncer do Sudeste e Sul”, lamenta o presidente da SBR, Robson Ferrigno.
Luciana Holtz, presidente do Instituto Oncoguia –
entidade que oferece assistência para as pessoas com câncer e seus familiares –
confirma a deficiência de radioterapia até mesmo nos centros de excelência no
tratamento do câncer. A instituição faz um trabalho voluntário com as mulheres
vítimas de câncer de mama que chegam ao Hospital Pérola Byngton, em São Paulo,
uma referência nacional em atendimento aos cânceres de mama e colo do útero.
“Mapeamos que boa parte destas mulheres, mesmo com
o resultado de câncer de mama em mãos, levou um ano pulando de unidade em
unidade até conseguir acesso ao tratamento”, diz Luciana. Márcia Barros, hoje
com 41 anos, foi uma das que peregrinou por 7 meses até conseguir fazer
radioterapia contra o câncer de mama no Hospital das Clínicas de São Paulo,
cinco anos atrás.
“Primeiro, foi o plano de saúde que me deixou na
mão na hora em que mais precisei, apesar de eu jamais ter atrasado o pagamento
da mensalidade. Depois foi o vácuo de informação, entre um hospital público e
outro, até conseguir fazer o tratamento”, lembra. “Já é uma doença que traz uma
série de incertezas. Quando a gente fica condenado a não ter tratamento, o medo
só aumenta”, diz ela que já está com o câncer controlado.
Pacientes invisíveis. A história de Márcia, vivenciada em São Paulo,
tende a ser ainda pior para os moradores de estados como Mato Grosso do Sul,
Distrito Federal e Rio Grande do Sul, onde a cobertura de radioterapia é mais
deficitária, mostrou o relatório do TCU. Mas além dos casos que são detectados
pelos levantamentos numéricos, o oncologista Rafael Kaliks chama a atenção para
os “pacientes fantasmas” que nem chegam a virar estatísticas da dificuldade do
acesso à radioterapia.
“No Brasil, os números são feitos conforme as
notificações dos centros que recebem os pacientes. Pelos dados do Inca, a
incidência de câncer em São Paulo chega a ser oito vezes maior do que no
Tocantins, por exemplo”, afirma. “Não há
nenhum fator ambiental, nada, que justifique uma diferença tão gritante, além
de uma falha em identificar e notificar os pacientes. São os casos invisíveis.
As pessoas morrem de câncer e no atestado de óbito, por desconhecimento e falha
do setor de saúde, a causa vem infecção generalizada.”
Cobertor curto. Se
a oferta de radioterapia hoje já não dá conta dos “pacientes visíveis”, os
especialistas ainda temem que um aumento da rede seja insuficiente para os
doentes estão por vir.
“Em 10 anos, tivemos um aumento de 69% nas
projeções de casos novos de câncer no Brasil. Hoje, os tumores malignos já são
a segunda causa de morte e em 2020, serão a primeira”, afirma o presidente da
Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica, Anderson Silvestrini. “Não só os
maus hábitos de vida impulsionam este aumento – tabagismo e obesidade são os
principais – mas o próprio envelhecimento populacional acarreta mais casos de
câncer”.
Este crescimento paulatino faz com que Silvestrini
não veja com otimismo o anúncio do Ministério da Saúde, feito na semana
passada, sobre o aumento da oferta de radioterapia no País. Segundo o
Ministério, serão investidos R$ 550 milhões na área e parte da verba será usada
para comprar 80 novos aparelhos de radioterapia, que vão conseguir atender mais
28 mil doentes até 2014.
“Estes pacientes a mais que serão contemplados (28
mil) daqui três anos são 33% dos que hoje, exatamente hoje, não têm acesso à
radioterapia. E a tendência é que esta demanda só aumente para um cobertor que
já é curto”, contemplou o presidente da Sociedade Brasileira de Radioterapia
http://saude.ig.com.br/minhasaude/2012-04-26/brasil-soma-85-mil-doentes-sem-radioterapia.html
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