quinta-feira, 19 de abril de 2012

Viva a sabedoria...


A Revolução dos Bichos
O Homem é o nosso verdadeiro e único inimigo. Retire-se da cena o Homem e a causa principal da fome e da sobrecarga de trabalho desaparecerá para sempre.
O Homem é a única criatura que consome sem produzir. Não dá leite, não põe ovos, é fraco demais para puxar o arado, não corre o que dê para pegar uma lebre. Mesmo assim, é o senhor de todos os animais. Põe-nos a mourejar, dá-nos de volta o mínimo para evitar a inanição e fica com o restante. Nosso trabalho amanha o solo, nosso estrume o fertiliza, e, no entanto, nenhum de nós possui mais que a própria pele. As vacas, que aqui vejo à minha frente, quantos litros de leite terão produzido neste ano? E que aconteceu a esse leite, que poderia estar alimentando robustos bezerrinhos? Desceu pela garganta dos nossos inimigos. E as galinhas, quantos ovos puseram neste ano, e quantos se transformaram em pintinhos? Os restantes foram para o mercado, fazer dinheiro para Jones e seus homens. E você, Quitéria, diga-me onde estão os quatro potrinhos que deveriam ser o apoio e o prazer da sua velhice. Foram vendidos com a idade de um ano --nunca mais você os verá. Como paga por seus quatro partos e por todo o seu trabalho no campo, que recebeu você, além de ração e baia?

O Olho e o Espírito, de Maurice Merleau-Ponty
A ciência manipula as coisas e renuncia a habitá-las. Fabrica para si modelos internos delas e, operando sobre esses índices ou variáveis as transformações permitidas por sua definição, só de longe em longe se defronta com o mundo atual. Ela é, sempre foi, esse pensamento admiravelmente ativo, engenhoso, desenvolto, esse parti pris de tratar todo o ser como "objeto em geral", isto é, a um tempo como se ele nada fosse para nós, e, no entanto, se achasse predestinado aos nossos artifícios.

Mas a ciência clássica guardava o sentimento da opacidade do mundo, era a este que ela pretendia juntar-se por suas construções, e por isto é que se acreditava obrigada a procurar para suas operações um fundamento transcendente ou transcendental. Há, hoje em dia - não na ciência, e sim numa filosofia das ciências assaz difundida -, isto de inteiramente novo: que a prática construtiva se torna e se dá por autônoma, e que o pensamento deliberadamente se reduz ao conjunto das técnicas ou tomada de captação, que ele inventa. Pensar é ensaiar, operar, transformar, sob a única reserva de um controle experimental onde só intervém fenômenos altamente "trabalhados", e que os nossos aparelhos produzem, em vez de registrá-los. Daí toda sorte de tentativas desordenadas. Nunca, como hoje, a ciência foi sensível às modas intelectuais. Quando um modelo foi bem sucedido numa ordem de problemas, ela o experimenta em toda a parte.

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