segunda-feira, 30 de abril de 2012

Viva a sabedoria...


Do socialismo utópico ao socialismo científico, Friedrich Engels
O socialismo moderno é, em primeiro lugar, por seu conteúdo, fruto do reflexo na inteligência, de um lado dos antagonismos de classe que imperam na moderna sociedade entre possuidores e despossuídos, capitalistas e operários assalariados, e, de outro lado, da anarquia que reina na produção. Por sua forma teórica, porém, o socialismo começa apresentando-se como uma continuação, mais desenvolvida e mais consequente, dos princípios proclamados pelos grandes pensadores franceses do século XVIII. Como toda nova teoria, o socialismo, embora tivesse suas raízes nos fatos materiais econômicos, teve de ligar-se, ao nascer, às Ideias existentes. Os grandes homens que, na França, iluminaram os cérebros para a revolução que se havia de desencadear, adotaram uma atitude resolutamente revolucionária. Não reconheciam autoridade exterior de nenhuma espécie. A religião, a concepção da natureza, a sociedade, a ordem estatal: tudo eles submetiam à crítica mais impiedosa; tudo quanto existia devia justificar os títulos de sua existência ante o foro da razão, ou renunciar a continuar existindo.



Dos Delitos e das Penas, Cesare Beccaria
A MORAL política não pode proporcionar à sociedade nenhuma vantagem durável, se não for fundada sobre sentimentos indeléveis do coração do homem.

Toda lei que não for estabelecida sobre essa base encontrará sempre uma resistência à qual será constrangida a ceder. Assim, a menor força, continuamente aplicada, destrói por fim um corpo que pareça sólido, porque lhe comunicou um movimento violento.

Consultemos, pois, o coração humano; acharemos nele os princípios fundamentais do direito de punir.

Ninguém fez gratuitamente o sacrifício de uma porção de sua liberdade visando unicamente ao bem público. Tais quimeras só se encontram nos romances. Cada homem só por seus interesses está ligado às diferentes combinações políticas deste globo; e cada qual desejaria, se fosse possível, não estar ligado pelas convenções que obrigam os outros homens. Sendo a multiplicação do gênero humano, embora lenta e pouco considerável, muito superior aos meios que apresentava a natureza estéril e abandonada, para satisfazer necessidades que se tornavam cada dia mais numerosas e se cruzavam de mil maneiras, os primeiros homens, até então selvagens, se viram forçados a reunir-se. Formadas algumas sociedades, logo se estabeleceram novas, na necessidade em que se ficou de resistir às primeiras, e assim viveram essas hordas, como tinham feito os indivíduos, num contínuo estado de guerra entre si. As leis foram as condições que reuniram os homens, a princípio independentes e isolados sobre a superfície da terra.

Cansados de só viver no meio de temores e de encontrar inimigos por toda parte, fatigados de uma liberdade que a incerteza de conservá-la tornava inútil, sacrificaram uma parte dela para gozar do resto com mais segurança. A soma de todas essas porções de liberdade, sacrificadas assim ao bem geral, formou a soberania da nação; e aquele que foi encarregado pelas leis do depósito das liberdades e dos cuidados da administração foi proclamado o soberano do povo.

Não bastava, porém, ter formado esse depósito; era preciso protegê-lo contra as usurpações de cada particular, pois tal é a tendência do homem para o despotismo, que ele procura sem cessar, não só retirar da massa comum sua porção de liberdade, mas ainda usurpar a dos outros.

Eram necessários meios sensíveis e bastante poderosos para comprimir esse espírito despótico, que logo tornou a mergulhar a sociedade no seu antigo caos. Esses meios foram as penas estabelecidas contra os infratores das leis.

Disse eu que esses meios tiveram de ser sensíveis, porque a experiência fez ver quanto a maioria está longe de adotar princípios estáveis de conduta. Nota-se, em todas as partes do mundo físico e moral, um princípio universal de dissolução, cuja ação só pode ser obstada nos seus efeitos sobre a sociedade por meios que impressionam imediatamente os sentidos e que se fixam nos espíritos, para contrabalançar por impressões vivas a força das paixões particulares, quase sempre opostas ao bem geral. Qualquer outro meio seria insuficiente. Quando as paixões são vivamente abaladas pelos objetos presentes, os mais sábios discursos, a eloqüência mais arrebatadora, as verdades mais sublimes, não passam, para elas, de um freio impotente que logo despedaçam.

Por conseguinte, só a necessidade constrange os homens a ceder uma parte de sua liberdade; daí resulta que cada um só consente em pôr no depósito comum a menor porção possível dela, isto é, precisamente o que era preciso para empenhar os outros em mantê-lo na posse do resto.

O conjunto de todas essas pequenas porções de liberdade é o fundamento do direito de punir. Todo exercício do poder que se afastar dessa base é abuso e não justiça; é um poder de fato e não de direito (8); é uma usurpação e não mais um poder legítimo.

As penas que ultrapassam a necessidade de conservar o depósito da salvação pública são injustas por sua natureza; e tanto mais justas serão quanto mais sagrada e inviolável for a segurança e maior a liberdade que o soberano conservar aos súditos.

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